Novo Governo: Costa mantém Godinho e dá sinal para manter bloqueios no trabalho e protecção social

António Costa anunciou o novo elenco governativo esta quarta-feira e não deixa boas perspectivas para o mundo do trabalho. Além de, no essencial, se terem confirmado os nomes que foram sendo apontados ao longo das últimas semanas e a concentração em figuras próximas do primeiro-ministro, o traço mais forte é mesmo a continuidade em várias pastas. A recondução de Ana Mendes Godinho no Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, após um mandato de dois anos que não deixa saudades nem história, só pode ser entendido como um sinal claro no sentido de manter um ministério sem força e sem qualquer intenção de fazer as mudanças necessárias no trabalho e na protecção social.

Ana Mendes Godinho aceitou, durante os dois anos de mandato, uma perspectiva meramente gestionária do Ministério, sem qualquer perspectiva de enfrentar os vários problemas estruturais que continuam por resolver. Aceitou o papel menor que Costa definiu para o mundo do trabalho, como um dos elementos centrais da dissolução da geringonça e da intenção declarada de governar sem compromissos à esquerda e afastando-se de qualquer programa de avanços nas matérias laborais. O primeiro mandato de Godinho ficou inevitavelmente marcado pela necessidade de responder a uma pandemia imprevista e aos seus efeitos devastadores – colocada, de forma inesperada, no centro da emergência, deu a cara por uma política contida e conduziu uma resposta muito insuficiente para os sectores mais precários. Os apoios extraordinários para quem estava em situação de maior desprotecção foram muito aquém do necessário, quase sempre tardios e alvo de sucessivas alterações, ao sabor da luta e da denúncia das pessoas que ficaram para trás.

A recondução de Ana Mendes Godinho só pode ser entendida como um sinal de continuidade que não antecipa boas notícias para os trabalhadores e as trabalhadoras. Uma continuidade da qual a ministra herda os seus impasses, bloqueios e as matérias importantes que continuam suspensas. Conforme é destacado pela imprensa na projecção dos desafios do novo mandato, estão por resolver matérias como a concretização da chamada Agenda do Trabalho Digno (que o anterior Governo deixou em suspenso e para uso eleitoral, não se sabendo ainda se vai manter ou desistir de medidas importantes), a solução para as pessoas que ficam sem protecção com o fim do AERT e estão numa situação dramática, a actualização de pensões ou ainda a reformulação das prestações sociais, nomeadamente para as pessoas em situação mais vulnerável, que permita evitar a pobreza. A estas soluções adiadas, junta-se agora um contexto incerto, com aumento do custo de vida e a perspectiva de uma nova crise, que, a confirmar-se, não poderá ter a mesma resposta hesitante e insuficiente que aconteceu na pandemia.

Na cultura, um sector particularmente afectado pela precariedade e onde se vem travando uma importante luta pelos direitos laborais, a escolha de Pedro Adão e Silva suscitou “perplexidade“. Entre as organizações de profissionais, é clara a preocupação com a definição da prioridade ao combate à precariedade. Exigem que o novo ministro “tome posição sobre as situações de precariedade laboral que permanecem em algumas instituições com financiamento público e algumas instituições públicas” e que o novo Estatuto dos Profissionais da Cultura seja revisto de modo a promover uma verdadeira transformação no sector, de modo a acabar com a generalização dos falsos recibos verdes e a garantir um pleno acesso à protecção social.

António Costa anunciou, durante semanas, que constituiria um “governo de combate” para tempos difíceis, para superar uma crise profunda. Agora que sabemos que se juntará mais crise à crise anterior, as escolhas de Costa não perspectivam um governo de combate à precariedade, às desigualdades no trabalho ou às insuficiências estruturais na protecção social.

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