Web Summit, investimentos e como trocar as prioridades da Sociedade

web summitO Web Summit aconteceu graças à ajuda preciosa de muitos voluntários e do Estado – porque um evento que cobra, no mínimo, 700 euros por bilhete precisa, e muito! Esta cimeira tecnológica trouxe consigo muito dinheiro de investidores, entre os quais o sector público que entrou com um milhão para apoiar a organização (com os nossos impostos) e mais 200 milhões para investir em novas startups (novamente com os nossos impostos), a que se juntaram mais cerca de 200 milhões do sector privado. Dinheiro que entra nas empresas e não propriamente no país.

Que mundo do investimento é este de que tanto se fala? Está a sociedade a usufruir dele? É a isto que chamamos desenvolvimento económico?

A Portugal Ventures, uma Sociedade de Capital de Risco com perfil corporativo, foi criada em 2012 para incentivar o desenvolvimento económico através de um programa de coinvestimento para empresas inovadoras que precisam de capital de risco. É uma Sociedade com diversos acionistas, na sua maioria do sector público, como o IAPMEI, A AICEP, a Direção Geral do Tesouro e das Finanças e o Turismo Portugal (porquê mesmo?). Mas também com acionistas privados como o Banco Comercial Português (Millenium BCP), Banco BPI, PME Investimentos, Banco BIC, Santader Totta, Petróleos de Portugal, Citibank International Limited, Novo Banco (aquele que andámos a salvar?), Banco Efisa, Açoreana Seguros e a Caixa Económica Montepio Geral. Só nomes de referência e que inspiram muita confiança, pois claro.
Esta Sociedade gere fundos no valor de 400 milhões. A ideia é desenvolver uma indústria de investidores nacionais e atrair fundos internacionais, aliciando-os com benefícios fiscais. E no que se concretiza todo este investimento? Onde estão os benefícios para o interesse público?

De acordo com o estudo “Empreendedorismo 2007-2015”, realizado pela Informa D&B, a taxa de sucesso das startups deixa muito a desejar, já que apenas um terço sobrevive aos primeiros 6 anos. Este mesmo estudo refere que as startups são responsáveis, em média, por 18% do emprego criado anualmente pelas empresas, mas se apenas 30% sobrevive, não se pode considerar que existe criação real de emprego estável. Mas o que acontece às startups que não sobrevivem? E de que tipo de emprego falamos?
No mundo dos investimentos, as startups são meras apostas. Na sua maioria, o financiamento é feito através de capitais de investidores privados (business angels, como lhes chamam!) ou através de capitais de risco que passam a possuir uma percentagem da empresa. Uma startup tem várias fases ao longo da sua vida, sendo que a última fase, denominada de “EXIT” é a que mais interessa aos investidores, já que é nesta fase que se coloca a possibilidade de venda da empresa. Ou seja, os ditos empreendores criam a ideia de negócio, desenvolvem-na e, no fim, são os investidores de capitais de risco que entram em ação e que impôem as suas regras. Isto significa poder retirar a empresa do país, mudar a sua sede fiscal em busca de (mais) benefícios fiscais ou alterar todo o negócio; e, no caso de correr mal leva-se a startup à falência e todo o conteúdo produzido fica sob a alçada dos investidores. E depois? Lá se vai o desenvolvimento económico para outro lado.

E que dizer do emprego criado? O recurso aos estágios IEFP e curriculares é bastante comum. Os primeiros, comparticipados pelo Estado e vendidos como incentivos económicos, são perfeitos para usar com jovens até aos 30 anos; e pode acontecer que estes estagiários tenham de devolver uma parte do salário à startup ou de repartir com dois ou mais colegas, que ainda estejam à espera de ter estágio aprovado, mas que já estejam a trabalhar. Os segundos servem só mesmo para explorar gratuitamente. Horas extras não pagas, seja durante a semana ou não, também fazem parte deste regime de precariedade onde o que interessa é fazer lucro e garantir que os investidores tenham retorno. Quanto a números de empregados, estas empresas crescem a uma média de 34% no primeiro ano e só duplicam passados 7 anos de atividade, se conguirem contrariar a tendência e passar do 6 ano de vida.

Tudo isto em prol do desenvolvimento económico. Mas que desenvolvimento? De quem? As startups surgem de interesses privados e com vista a garantir interesses privados: uma ou duas pessoas criam uma ideia de negócio com vista à obtenção de lucro para si mesmas e para os investidores que sobre os lucros ganhem direitos. Algumas contribuem para o desenvolvimento tecnológico, outras nem por isso.
O Estado investe em benefício de uns e dos seus interesses privados em detrimento do interesse público.

Num mundo ameaçado pelas alterações climáticas, não deveríamos exigir que se investisse no corte das emissões de gases de efeito de estufa na atmosfera? Não seria mais útil desenvolver a economia de modo a mitigar os efeitos das alterações climáticas e incentivar à criação de empregos com vista à proteção do clima? Não deveria ser esta a prioridade: a de garantir que conseguimos continuar a viver?

Para mais informação sobre a Campanha Empregos para o Clima: empregos-clima.pt.

 

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