A partir de hoje somos mais precári@s

Foi no início desta semana que saiu um estudo sobre as condições de precariedade em que vivem cerca de 31% das famílias portuguesas, o que em conjunto com os 20,1% de pobres, dá mais de metade da população trabalhadora portuguesa. Outras conclusões deste estudo são: um quinto dos inquiridos tem dificuldades no pagamento das contas da casa, e 21% destas famílias não tem capacidade de suportar despesas inesperadas, quando o mesmo já acontece em 21,5% do total de agregados portugueses. Isto só quer dizer que estas pessoas estão a viver no limite, e qualquer deslize as pode fazer derrapar para uma situação ainda mais precária.
Pois hoje deslizamos para essa situação. Hoje foi o dia de todos os aumentos. A partir deste dia 1 de Julho haverá aumentos de um ponto percentual no IVA em todas as taxas, e um aumento de 1,5 pontos percentuais no IRS, além de outras medidas que vêm no pacote do PEC2. Mas é o aumento destas duas taxas, que começaram a fazer efeito a partir da meia-noite, que vão afectar mais rapidamente o rendimento e as despesas.

O aumento do IVA é cego e injusto: a taxa normal sobe de 20% para 21%, a intermédia de 12% para 13% e a reduzida de 5% para 6%. Por mais que se tente uma subtileza com os números, o agravamento é muito significativo: o aumento de 5% para 6% corresponde de facto a um aumento de 20% do imposto de bens essenciais (produtos alimentares básicos, água, electricidade e gás natural); o aumento da taxa intermédia de 12% para 13% implica um aumento de 8,3% (afectando muitos produtos alimentares e a restauração); finalmente o aumento de 20% para 21% corresponde a um aumento de 5% (incidindo sobre a generalidade dos produtos). Ou seja, além deste aumento não ter em conta qualquer diferenciação segundo os rendimentos disponíveis, o agravamento é maior nos bens essenciais – o aumento da taxa reduzida é muito mais significativo em termos relativos e tem um impacto social muito maior.

Com o aumento do IRS os salários dos trabalhadores também vão ser sujeitos a mais impostos. Para as remunerações acima do 4º escalão de rendimento (equivalente a 17.979 Euros anuais) o aumento é de 1,5%. Todos os escalões inferiores sofrerão o aumento de um ponto percentual, ficando apenas de fora os rendimentos abaixo do salário mínimo. Este agravamento da taxa de IRS será corresponde ao valor retido na fonte, e por isso, traduz-se na redução imediata do salário dos trabalhadores. No entanto, por detrás deste aumento está escondida uma outra taxa de imposto agravada de 0,58% e 0,88%, ou seja, cresce também o valor efectivo do imposto cobrado. Pagamos mais antecipadamente, mas também mais no final. E, mais uma vez, são mais penalizados os rendimentos mais baixos: o aumento prevê apenas duas taxas de agravamento para todos os escalões, dispensando o princípio de progressividade.

Voltando a outra conclusão do estudo que saiu esta semana, que é a seguinte: para estas famílias, um dos factores para uma vida sem perspectivas de segurança financeira são os regimes laborais que provocam aumento da pobreza, como os “falsos recibos verdes”. Segundo dois fiscalistas, através do jornal i, o impacto destas medidas terá exactamente mais efeito nos trabalhadores independentes e nos falsos recibos-verdes. “A partir de hoje, quando passar um recibo verde, o trabalhador vai liquidar 21% de IVA, mas vai reter 21,5% para o IRS, o que significa “um pouco menos de dinheiro no bolso”, diz o fiscalista.”. Como aliás já tinhamos anunciado aqui no blog.

A partir de hoje muitas pessoas terão o cinto mais apertado e outras cairão para um escalão abaixo do limiar da pobreza. Não temos ilusões: esta política é a austeridade sem fim à vista. O efeito destas medidas agora implementadas será uma permanente e “inevitável” austeridade para longos e penosos anos. Ameaçam-nos também com mais desregulamentação das leis laborais, com mais precariedade, com menos salário, com a destruição dos serviços públicos e do Estado Social. Os Precários Inflexíveis estão e querem estar do lado contrário, juntando a sua voz à tua, nesse combate sem tréguas pelo nosso futuro.
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