Agora no CES: mais um concurso de bolsa para contornar dificuldades na contratação de pessoal

Precisa de uma secretária no seu centro de investigação? Abra um concurso para bolsa de gestão de ciência e tecnologia. É a própria FCT e a atual política de financiamento da ciência que promovem esta situação. Precariedade garantida!

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Este parece ser o mote dos dias que correm nas instituições de ensino superior, nos centros e laboratórios de investigação e também na própria FCT. Exemplos não faltam, mas este foi enviado à Associação de Combate à Precariedade – Precários Inflexíveis, a propósito última denúncia que fizemos: Universidade de Coimbra contrata bolseiros para cobrar propinas!

Agora trata-se de um concurso para uma Bolsa de Gestão de Ciência e Tecnologia no âmbito das atividades de apoio aos programas de doutoramento e é o CES – Centro de Estudo Sociais da Universidade de Coimbra que o promove. Ver anúncio do concurso aqui.

Este é mais um exemplo que demonstra como a generalização das bolsas no sector da ciência é um facto; como o atual Regulamento de Bolsas da FCT e o Estatuto do Bolseiro (ver Art. 2.º) são, de modo gravoso, simultaneamente muito concretos e muito amplos (a justificação do âmbito da bolsa com a possibilidade de «formação complementar» ou «atualização da formação» anexa à execução de tarefas várias, ou com atividades de investigação científica «com caráter de iniciação ou atualização» dão para quase tudo); e como nem instituições como o CES conseguem contornar a política de financiamento e de ilegibilidade de contratos de trabalho anexos a projetos, o que nos coloca a todos num aparente beco sem saída.

Já se sabe que não há alternativa… e, por isso, verificamos que o concurso do CES enquadra esta bolsa de gestão de ciência e tecnologia «no âmbito das atividades de apoio aos programas de doutoramento de que o CES é instituição parceira», ou seja, nem sequer é preciso dizer que se trata de um qualquer projeto ou atividade de investigação ou de formação. Assume-se que a necessidade é a da criação de um posto de trabalho para assegurar tarefas de gestão e administração dos programas de doutoramento e pronto.

Mas o Regulamento de Bolsas da FCT define concretamente o âmbito destas bolsas:

ARTIGO 9.º
BOLSAS DE GESTÃO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA
1. As bolsas de gestão de ciência e tecnologia (BGCT) destinam-se a licenciados, mestres ou doutores, com vista a proporcionar formação complementar em gestão de programas de ciência, tecnologia e inovação, ou formação na observação e monitorização do sistema científico e tecnológico ou do ensino superior, e ainda para obterem formação em instituições relevantes para o sistema científico e tecnológico nacional de reconhecida qualidade e adequada dimensão, em Portugal ou no estrangeiro.

Não há alternativa… e sobretudo não há quem fiscalize. Até porque se houvesse teriam de fechar muitos centros de investigação ou descontinuar muitos projetos de investigação, pois falsas bolsas não faltam e é a própria FCT que impõe essa situação. Sabemos que, por vezes, as unidades de I&D têm de alterar os formulários para submissão de projetos de investigação a concursos porque a FCT lhes diz que aquele contrato de trabalho previsto tem de ser afinal uma bolsa e assim os valores são recalculados. A precariedade sai sempre mais barata.

Em vez de uma política de contratação de investigadores, técnicos e pessoal administrativo, a solução imposta tem sido a de reiterar o abuso e promover a precariedade laboral, recorrendo-se às famigeradas bolsas. É um recurso fácil para obter mão-de-obra qualificada e barata, e suspender os direitos laborais e a proteção social de quem sustenta o, então, cada vez mais frágil edifício científico português. Isto, a par do magríssimo financiamento público da investigação científica e do ensino superior, é o cenário do desastre.

Como revelou o inquérito que fizemos no ano passado: a grande maioria dos investigadores são eternos bolseiros, dificilmente têm acesso a um contrato de trabalho e perante a sua condição precária, pretendem emigrar.

Poderíamos começar a perguntar de vez e com o futuro nas mãos: mas não há alternativa?

 

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