Alterações à lei laboral: Governo cede aos patrões e limita combate à precariedade
O acordo na concertação social anunciado esta quarta-feira, estabelecido entre as associações patronais e UGT, confirma o cenário que o Governo foi preparando ao longo das últimas semanas. Apesar de as medidas de alteração à legislação laboral, nomeadamente as que se incluem na promessa de combate à precariedade, fazerem parte do compromisso que suporta o Governo, este optou por ceder aos patrões. Assim, o acordo agora anunciado inclui várias medidas erradas e que contrariam o prometido combate à precariedade, nomeadamente o aumento do número de dias do período experimental e o alargamento, e a facilitação, dos contratos de muito curta duração, mas também a manutenção do banco de horas individual durante mais um ano e a facilitação do banco de horas grupal. Estas alterações à lei laboral vão ser discutidas no parlamento no próximo dia 6 de Julho.
Embora o documento do acordo não tenha ainda sido divulgado, o anúncio das medidas mais importantes corresponde a um cenário bem diferente do compromisso com a reversão dos aspectos mais graves introduzidos na legislação laboral no ciclo anterior, e de um efectivo combate à precariedade. O alargamento da duração e do âmbito dos contratos de muito curta duração é um bom exemplo desta opção. Estes contratos, que permitem trabalho sem contrato escrito até 15 dias, que são já uma excepção que viabiliza a precariedade total na agricultura e no turismo, passará a ser possível em todos os sectores e até 35 dias de trabalho.
Há, no entanto, aspectos neste pacote de alteração legislativa que correspondem a avanços importantes: a redução do número de renovações, e do tempo máximo dos contratos a termo (que passam de três para dois anos), e a termo incerto (que passam de seis para quatro anos), bem como as restrições nas situações admissíveis para a celebração de contratos a termo, mesmo admitindo que se podia ter ido mais longe, correspondem a mudanças positivas. De forma contraditória, para compensar os patrões e obter a sua assinatura, o Governo introduz um incompreensível alargamento do período experimental, para 180 dias, para jovens à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração.
As mudanças no trabalho temporário, apesar de aquém do necessário, são um primeiro passo para diminuir a total impunidade nesse autêntico off shore laboral de que as empresas dispõem, introduzindo-se finalmente alguma limitação à renovação dos contratos, que actualmente podem ser simplesmente renovados até mesmo diariamente. Mas é incompreensível que o Governo escolha limites diferentes e menos apertados do que o que fica definido para os contratos a prazo, quando havia a promessa de equiparar estes regimes. E fica por confirmar ainda se vai ou não haver uma limitação às condições de celebração destes contratos, e ao dever de informação das empresas aos trabalhadores, das razões que justificam a intermediação por uma empresa de trabalho temporário. Falta ainda perceber também como se concretizará a aplicação de uma taxa às empresas por recurso à precariedade: apesar do princípio ser correcto, dado que permite remunerar a Segurança Social para assegurar os encargos adicionais que resultam das opções das empresas, esta medida não pode ser apenas simbólica, normalizante de altos níveis de precariedade em vários sectores e, ainda menos, dar uma aparência de legalidade às situações em que deveria haver contratação sem termo.
O Governo sacrificou o campo em que tinha maioria para avançar de forma determinada nos direitos laborais, indo ao encontro dos interesses patronais. É, aliás, bastante esclarecedor que os patrões assinem este acordo, depois de terem feito da recusa de alterações à lei laboral a sua bandeira principal desde o início da legislatura. Com esta opção, o Governo perde voluntariamente a oportunidade de introduzir mudanças profundas na legislação, corrigindo os brutais desequilíbrios que se acentuaram com a governação anterior, apostando efectivamente no combate à precariedade. Não admira, pois, que a CGTP tenha ficado fora do acordo e que se revele a oposição no campo da maioria parlamentar que suporta o Governo, ao mesmo tempo que as garantias de aprovação vêm precisamente da direita.
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