Aprofundamento da lei de combate à precariedade entra hoje em vigor: uma vitória e uma nova esperança para milhares de precários

A partir de hoje, dia 1 de Agosto, entra em vigor o reforço da lei de combate à precariedade. Este é um novo passo, muito importante, que concretiza o essencial das propostas que colocámos como um mínimo no reforço do combate à precariedade no privado: uma maior protecção do trabalhador durante o processo de regularização; e o alargamento a todas as situações em que está em causa o direito ao contrato de trabalho. É assim aprofundada a abordagem que foi iniciada com a vitória da iniciativa de cidadãos e que, pela primeira vez, criou mecanismos centrados no que é essencial: transformar vínculos precários e ilegais em contratos de trabalho com direitos.

A Lei 55/2017 vem então alterar a legislação que, a partir de 2013, ficou conhecida como “lei de combate aos falsos recibos verdes” (a Lei 63/2013). O novo âmbito é precisamente um dos aspectos fundamentais desta alteração. Até aqui, a legislação apenas se aplicava às situações de falso recibo verde, mas agora vai permitir a regularização de todas situações de trabalho não declarado. Ou seja, todas as situações em que deveria existir um contrato de trabalho, que está dissimulado nas várias modalidades irregulares – além das falsas prestações de serviço, também as falsas bolsas, os falsos estágios ou o trabalho informal.

Outra questão essencial, pela qual lutávamos há muito, é a introdução de um mecanismo para proteger os trabalhadores durante o processo de regularização. O balanço da aplicação da lei ao longo destes 4 anos demonstrava que este passo era, como sempre afirmámos, imprescindível. É vital proteger quem está numa situação de precariedade da retaliação e da chantagem patronal, impedindo o despedimento durante o processo. A solução prevista é um procedimento cautelar, instaurado pelo Ministério Público, caso o patrão tente despedir o trabalhador a partir do momento em que a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) inicia o processo. Esta foi a alternativa encontrada, que, embora não corresponda à nossa proposta inicial – dar mais poderes à ACT e conferir direitos equivalentes ao contrato de trabalho logo a partir do momento em que a situação irregular é detectada – representa uma nova e importante garantia de protecção para o trabalhador.

As restantes alterações referem-se à acção judicial de reconhecimento do contrato de trabalho, que acontece de forma automática (por iniciativa do Ministério Público e sem necessidade do trabalhador tomar a difícil iniciativa de enfrentar o patrão), sempre que a entidade empregadora não regulariza voluntariamente a situação precária e ilegal.

Assim, termina a suposta tentativa de “conciliação”, que estava até aqui prevista para antes do julgamento, nos casos em que o processo avança para a via judicial. A prática confirmou que este é mais um elemento de chantagem e pressão sobre o trabalhador, além de não assegurar que a acção prossegue os seus objectivos. Verificar a existência ou não de uma relação laboral ocultada por uma modalidade precária ilegal não podia estar, como até aqui, em “discussão” entre patrão e trabalhador.

É também clarificado do papel Ministério Público, sendo expressamente reconhecida a sua legitimidade em todo o processo. Esta é uma garantia essencial, contribuindo também para a confirmar o interesse público da causa.

Finalmente, há uma outra alteração que poderá fazer uma enorme diferença para quem beneficia da aplicação da lei. A partir de agora, fica claro que a decisão judicial que reconhece o direito ao contrato de trabalho deve ser comunicada ao Instituto da Segurança Social (ISS), como a clara instrução para proceder à devida regularização da carreira contributiva. Reconhece-se, assim, como alertávamos há muito, que frequentemente as decisões judiciais não tinham os devidos efeitos nas contribuições. Com esta alteração, não restam dúvidas de que o ISS terá de actualizar o histórico de contribuições, reconhecendo carreira e direitos, bem como fazer o respectivo acerto de contas e responsabilizar o empregador.

Batemo-nos por estas alterações, tal como lutámos para que este caminho fosse iniciado há cerca de 4 anos atrás. Foi um longo percurso de mobilização e trabalho sistemático, que passou pela iniciativa legislativa cidadã iniciada em 2011, que continuou na dura luta que viria a resultar na aprovação da lei em 2013, mas também no empenho e crítica na difícil aplicação da lei. A força dos precários foi o aspecto essencial, que conseguiu vencer o conservadorismo e tolerância perante a impunidade total. As alterações que agora entram em vigor são mais um avanço, que não teria sido possível sem o trabalho persistente de apoio às situações concretas, de vigilância da aplicação da lei e de proposta. Estas alterações não resolverão tudo, mas são um passo muito importante. É uma vitória e uma nova esperança para muitos milhares de precários.

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