Austeridade coloca Saúde em risco

Uma das grandes conquistas da democracia em Portugal, no final dos anos 70, foi a criação de uma rede de pública de prestação de cuidados de saúde aos cidadãos. Esta rede é o Serviço Nacional de Saúde que aproximou todas as pessoas de cuidados básicos de saúde que não eram obtidos antes da criação desta rede. Só para ter uma ideia da magnitude e do pilar do SNS o número de consultas aumentou de 8 milhões de consultas por ano em 1960, para 47 milhões em 2008. Apenas se observa uma quebra no crescimento das consultas no início dos anos 80 que curiosamente coincide com a intervenção do FMI em Portugal nos anos 80.
Hoje o SNS volta a estar em risco com as políticas de austeridade, quem o diz é o Director da escola Nacional de Saúde Pública que em entrevista à LUSA admite que as medidas do Orçamento de Estado são de tal ordem fortes que, a seguir este caminho, o SNS será diferente: as pessoas terão maior dificuldade de acesso a cuidados de qualidade, e levará, em última hipótese à exclusão de pessoas dos cuidados de saúde.

Para não ter quaisquer outras suspeitas de que o plano é este olhemos para a nossa bola de cristal, que infelizmente é a Grécia. Num artigo publicado ainda no início de Agosto no Guardian era analisada a catástrofe que estava já nessa altura a atingir o sistema de saúde grego. O artigo começa com o exemplo de um diabético, que depois de ser despedido deixou de ter acesso aos medicamentos que necessitava para sobreviver e passou a recorrer à assistência médica internacional, que está situada na Grécia para ajudar os imigrantes ilegais que chegam de África. O sistema de saúde lida diariamente com faltas de material, de médicos e outras dificuldades. 


Passados dois meses, em Outubro deste ano, o mesmo jornal volta a escrever um artigo sobre o mesmo problema com o título “Os Gregos estão a pagar a crise com a sua saúde”. O retrato é ainda mais devastador e o artigo começa novamente com a história de um diabético, só que desta vez a história é ainda mais grave: “Quando vês um diabético incapaz de comprar a sua própria insulina sabes que ele vai morrer” diz o médico Michaelis Samarkos. Muitos gregos perderam o acesso à saúde através do trabalho ou dos planos de protecção social. Muitos deles que antes recorriam aos serviços privados estão agora a utilizar os serviços públicos, quando o orçamento destes hospitais desceu 40% em dois anos apenas. Muitos habitantes não têm mesmo a capacidade pagar os 5€ de taxa moderadora imposta pelas medidas de austeridade. O resultado é trágico: as pessoas estão a perder acesso a cuidados de saúde e de prevenção de doenças, o risco de contrair doenças sexualmente transmissíveis aumentou e a taxa de suicídios aumentou 17%.

Em Portugal a situação não é ainda tão dramática, mas o caminho trilhado pelo Ministro Paulo Macedo (ex-gestor da Médis – seguros de saúde) e por este Orçamento de Estado não é diferente do caminho da exclusão do SNS. São as próprias companhias de seguros que avisam já da mudança. A apresentadora Fátima Lopes, conhecida de muitas pessoas que necessitam de cuidados de saúde regulares, dá o rosto a esta campanha: “Muitas pessoas nunca acharam ser necessário ter seguro de saúde. Mas a verdade é que os tempos estão a mudar”.

O SNS contribui de forma inquestionável para a liberdade de milhões de pessoas, contribui para a subida da qualidade de vida e permite que haja um acesso de forma igual, sem exclusão de todos os habitantes. Este Governo quer mudar isso, e para isso planeia já neste Orçamento de Estado com medidas nesse sentido. Esta é uma luta que todos nós temos de travar, correndo o risco perder o contrato social baseado na solidariedade e transformando-nos numa sociedade que mata os mais pobres. Lutar contra a austeridade é também lutar por cuidados de saúde universais e manter o SNS.

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