Bairro da Torre – Ameaças, Subornos e uma Promessa do Presidente Carlos Teixeira

Os Precários Inflexíveis estiveram esta tarde na Câmara Municipal de Loures, numa Acção de Solidariedade com os habitantes do Bairro da Torre, em Camarate (Loures). Uma tarde de luta, paciência e desconstrução de inevitabilidades, em que a força popular abriu caminho a uma solução que se adivinhava difícil. A comunidade está unida e apesar de toda a espécie de chantagens a que tem sido submetida, mantém-se forte. Com nada a perder, avançaram sem medo e arrancaram garantias pessoais do Presidente da Câmara de que não serão despejados das suas barracas.

No dia 1 de Abril foi afixado um edital nas paredes de várias barracas do Bairro da Torre, dando aos moradores 20 dias úteis para deixarem as suas habitações, que iriam ser demolidas pelos serviços municipais. Sem opções, e estando a maior parte dos habitantes do bairro desempregada e sem acesso a outros meios de habitação, houve uma mobilização popular para exigir alternativas.
Dia 28 de Abril, pelo menos uma centena de moradores entrou na Assembleia Municipal para reivindicar novas habitações. A delegação exigiu ao presidente da Câmara, Carlos Teixeira, habitações de acordo com aquilo que os moradores pudessem pagar de renda. Em resposta, a vereadora da Coesão Social e Habitação, Sónia Paixão, argumentara que os moradores não tinham direito a uma nova casa por não estarem inscritos no Plano Especial de Realojamento e por haver famílias que recebiam subsídio de reinserção de outros municípios.
Após esta intervenção, alguns habitantes procuraram os serviços de uma advogada, Aline Bartolomeu, que declarou a ilegalidade das demolições que já ocorreram, assim como de demolições que se viessem a verificar, por não ter existido audiência prévia. Pretende portanto avançar com uma providência cautelar contra as demolições ilegais. Quanto às declarações da vereadora Sónia Paixão reclamou o facto de a mesma não ter sido capaz de identificar quem estaria a receber subsídio de reinserção em outros municípios, afirmando que nenhuma das famílias que representa se encontra nessa situação. Declarou ainda que há bastantes pessoas do Bairro da Torre que estão inscritas no PER, tendo até nascido no local, mas cujas casas em que vivem já foram meio demolidas pelas autoridades. As pessoas não inscritas no PER teriam direito a estarem no programa PROHABITA, destinado a colmatar alguns vazios do PER. A vereadora parece alheia à existência deste programa, assim como a quem tem direito ao mesmo. Da parte da câmara tem-se notado em geral uma atitude de desprezo, que estará provavelmente associada ao facto de a maioria dos habitantes serem ciganos e africanos. No entanto, mais que uma questão étnica, o que parece estar em causa é uma questão económica. Os terrenos onde está o Bairro da Torre, freguesia de Camarate, pertenciam anteriormente ao aeroporto de Lisboa, mas em 2009 foram adquiridos por um particular, embora a grande maioria dos mais de 1500 habitantes aí residisse. A Câmara de Loures não terá procurado atempadamente enquadrar a situação destas pessoas e pretenderá agora livrar-se delas sem cumprir com as suas responsabilidades e com a lei.
Organizou-se uma concentração para 6ª feira, dia 6, frente à Câmara Municipal de Loures, de modo a exigir ao executivo camarário uma resolução para o problema destes munícipes. As associações Solidariedade Imigrante e Viver no Mundo promoveram o evento. Na noite anterior começaram as pressões: segundo os habitantes do bairro, houve intimidações telefónicas anónimas, ameaças a quem não tem nacionalidade portuguesa, chamadas de uma assistente social chamada Rute oferecendo 600 euros (de apoio ao arrendamento) a quem não se apresentasse na Praça da Liberdade, entre outras.
No dia, uma pequena multidão de cerca de 40 pessoas concentra-se frente à Câmara para fazer ouvir a sua voz. “É preciso parar com a demolição”, “Queremos casa não queremos dinheiro”, diz-se, bem alto, para todos que queiram ouvir, em particular para o pelotão de 8 polícias que se perfila frente à Câmara. Os cidadãos decidem que devem ser ouvidos pelo presidente da Câmara e encaminham-se à entrada. A polícia procura bloquear o caminho, dizendo que apenas podem entrar 5 pessoas, sem justificação aparente. Entram aproximadamente 10. Na recepção as pessoas exigem ser recebidas. A secretária explica que o presidente não está, que é preciso marcar uma audiência, protela. A advogada reclama que já pedira várias audiências e que nunca havia sido recebida. As pessoas fincam pé. A polícia tenta dissuadir quem regista as discussões de o fazer. As pessoas insistem, a secretária atira-lhes formalidades, formulários e requerimentos de audiências. As pessoas exigem ser recebidas. Passados cerca de 40 minutos, aparece uma polícia à paisana com uma chamada da vereadora para a advogada. A vereadora promete uma reunião com 4 elementos dentre os habitantes do Bairro da Torre, desde que toda a gente se retire de dentro do edifício da câmara. As pessoas exigem falar com o Presidente da Câmara e serem 6 a ser recebidas, em vez de 4. A vereadora aceita. Afinal o pr
esidente sempre estava.
Constitui-se a comissão com 6 pessoas, entre representantes de associações, de moradores e a advogada. Cá fora espera-se. Uma das representantes sai a meio da reunião: “Ele só diz que não há nada p’ra ninguém…”. Suspira-se.
Passa mais uma hora e finalmente saem os representantes. O presidente da câmara compromete-se a não deitar abaixo as casas das pessoas que não aceitaram os 600 euros da Segurança Social, e exige as declarações de IRS a todos os habitantes do Bairro. Nova reunião é marcada para a próxima 3ª feira, dia 10. Uma pequena vitória. Mas nada ficou no papel.
O que se pôde observar claramente foi a tentativa de quebrar a solidariedade dentro do bairro através de ameaças, subornos e chantagens. Observou-se que quem se submeteu ao suborno oferecido pela câmara através da Segurança Social foi depois crucificado pela mesma e que portanto não parecem haver limites para as pressões e o despotismo a que os habitantes do Bairro da Torre estão expostos. Na união residiu a única força destas pessoas que nada têm a perder.
Os Precários Inflexíveis manter-se-ão presentes e atentos a novos desenvolvimentos, garantindo a sua solidariedade total para com esta camada tão frágil e precária (e portanto ainda mais sujeita às chantagens que se aplicam sob todo o povo português) da sociedade.
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