Bolseiros de Investigação: Em greve pelo direito à greve

Os Precários Inflexíveis pediram ao Miguel Heleno, Bolseiro, um texto sobre as razões que levam um bolseiro de investigação científica a aderir à Greve Geral:
«Com bolsas desde Integração na Investigação até Pós-Doutoramento, não é certo o número de bolseiros de investigação em Portugal. Estimativas de 2011 apontavam para cerca 20 mil, mas nem a FCT nem nenhum governo divulgaram o número de pessoas que estão enquadradas na figura de bolseiro de investigação. Apesar de mais de 80% dos artigos científicos escritos em Portugal terem pelo menos um autor enquadrado neste regime, as bolsas de investigação continuam a ser subsídios dados ao bolseiro(a) mediante o cumprimento de um plano de atividades de caráter científico. Os valores das bolsas variam de acordo com o grau académico, mas, seja qual for o escalão, estas não sofrem aumentos há mais de 10 anos.A segurança social fica a cargo do bolseiro, através do seguro social voluntário, sendo que a maioria dos centros de investigação devolve o equivalente ao escalão mínimo. As bolsas de investigação têm duração variável, normalmente entre 3 e 12 meses, fazendo com que as carreiras científicas se desenrolem “de bolsa em bolsa” durante vários anos.

Estas bolsas são, portanto, mais uma face da precariedade que se instalou nas universidades e nos institutos de investigação. No caso das Universidades, o subfinanciamento leva a que muitos bolseiros sejam pressionados para acumular também funções de docente, em grande parte dos casos de modo informal e sem remuneração. Tudo isto numa lógica de valorização do currículo, alimentando o sonho de uma carreira científica que tarda em chegar.


 O estatuto de bolseiro de investigação, aprovado pelo governo de Santana Lopes, não reconhece a bolsas como contratos de trabalho. As férias são chamados “dias de descanso” e não é reconhecido o direito à sindicalização nem tão pouco o direito à greve. Por outro lado, este estatuto já passa a tratar os bolseiros como trabalhadores ao conceder liberdade às instituições para definir os seus horários de trabalho…Para pôr fim a esta esquizofrenia laboral em que vive grande parte dos investigadores no nosso país, os bolseiros de investigação e a associação que os representa (ABIC) têm levado a cabo uma luta pelo direito ao contrato de trabalho, reivindicando uma condição que já aceite em praticamente toda a europa. No mês passado, foi escrito mais um capítulo desta luta com uma petição, entregue na Assembleia da República, que exigia uma alteração ao estatuto de bolseiro.

Contudo, a luta dos bolseiros não se esgota nesta petição. É uma luta ampla pelo reconhecimento do nosso trabalho enquanto tal. A Greve Geral é um momento político que certamente não passará ao lado dos bolseiros de investigação. No dia 22, seremos muitos e estaremos ao lado dos nossos professores, para dizer que o nosso contrato de trabalho não tem de significar cortes de salários nem redução de horários para eles. Seremos muitos e estaremos junto dos estudantes para mostrar que a luta contra o subfinanciamento das Universidades também é nossa. Seremos muitos e estaremos ao lado dos demais precários e dos desempregados na luta pelo emprego com direitos. Seremos muitos e estaremos em Greve, principalmente por não nos ser reconhecido o direito a fazê-la.

Miguel Heleno»

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