Bruxelas prepara diretiva europeia sobre direitos dos trabalhadores independentes ou “autónomos”, abrangerá também o trabalho uberizado
Enquanto em Portugal estão atualmente a ser discutidas e votadas, em sede de especialidade, as alterações à legislação laboral contidas na “Agenda do trabalho digno”, apresentada pelo Governo no passado mês de Junho, está a ser preparada em Bruxelas uma diretiva europeia respeitante aos direitos dos trabalhadores independentes ou “autónomos”, que se debruçará também sobre o trabalho uberizado.
A Associação de Combate à Precariedade – Precários Inflexíveis reafirma a sua frontal discordância com o recuo do Governo no que toca à presunção de laboralidade no trabalho em plataformas ocorrido entre a versão inicial da ATD de outubro do ano passado, que seguia as orientações do Livro Verde do Futuro do Trabalho, e a versão submetida ao Parlamento em junho passado. Como referimos no nosso parecer a essa versão (link nos comentários), “as gigantes multinacionais das plataformas mobilizaram todo o seu poder para manter um modelo de negócio que contorna a lei laboral e nega qualquer direito (…) Consideramos o recuo do Governo muito negativo e rejeitamos fortemente o modelo agora proposto para a regulação de trabalho em plataformas digitais”. Mais recentemente, na discussão em Comissão, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentou medidas que tentam corrigir os danos introduzidos pelo Governo, mas mantendo a figura do intermediário. Ou seja, o PS e o Governo, mesmo que com algumas nuances novas, pretendem generalizar a todas as plataformas o modelo da “Lei TVDE” de 2018, a qual a Uber apelidou de “modelo de ouro”. A conjugação desta intenção com o facto de muitos trabalhadores de plataformas, nomeadamente entre as e os estafetas, serem pessoas migrantes, tornará quase impossível o reconhecimento de contratos de trabalho neste setor por via administrativa e/ou judicial.
Se o Governo proclama ter apresentado uma Agenda “poderosa” de combate à precariedade, o que se confirma é a vontade de não mexer no de desequilíbrio geral nas relações laborais em Portugal, que promove e acentua a precarização. Esse desequilíbrio é mesmo agravado quando se alarga o modelo de desregulação laboral dos TVDE a todas as plataformas digitais. As medidas que poderão limitar outros tipos de precarização ficam dependentes de uma mudança no compromisso do Governo e das entidades públicas para a sua efectiva concretização. Só com um grande reforço na fiscalização pró-activa por parte da Autoridade para as Condições do Trabalho no que toca a situações de trabalho subordinado estável disfarçado com vínculos precários (como sejam o falso outsourcing, o trabalho informal, a exploração de pessoas migrantes, ou outras formas de violação dos direitos laborais), estas medidas poderão passar do papel para o combate efetivo à precariedade generalizada.