Cavaco Silva fala em "situação explosiva", mas não do combustível

O Presidente da República dirigiu-se no dia 1 de Janeio ao país, na habitual “mensagem de ano novo”. Falou para um país mergulhado numa crise e, de facto, não ignorou esse aspecto, por isso falou na “situação explosiva”. Mas, ao contrário do que dizem alguns analistas, ter coragem não é dizer o que toda a gente já sabe.

Passou o ano de 2009 e entra 2010 com a certeza de mais desemprego e precariedade. Para 1/3 dos trabalhadores em Portugal a precariedade já é a forma de fazer contas à vida, dia a dia, semana a semana, mês a mês. Para os restantes, é a proposta em cima da mesa. Cerca de 700.000 pessoas não têm emprego e metade delas ficam à porta na Segurança Social, estando apenas entregues à solitária e invejosa máxima do “cada um por si”.

É claro que Cavaco teria que falar no desemprego e a referência à “situação explosiva” é o espelho da enorme tensão social que ninguém pode ignorar. O discurso do Presidente fica marcado pela análise pela negativa, como seria de esperar, mas também pela ausência de caminhos políticos concretos para tanta gente, num país em que uma em cinco pessoas se encontra em risco de pobreza. Terá sido um “discurso duro”? Difícil teria sido falar nas causas e nos responsáveis desta situação, coisa que Cavaco não quer nem pode – afinal de contas, ele próprio não está, de maneira nenhuma, de fora dessas contas.

Ou seja, nada de novo para o conjunto dos trabalhadores. A ausência de uma posição política clara apenas abalou a monotonia dos discursos presidenciais, não as causas dos problemas. Dizer que “o pais real, que quer trabalhar e que quer uma vida melhor, espera que os agentes políticos deixem de lado as querelas artificiais que em nada resolvem os problemas das pessoas” não adianta muito mais do que uma constatação. Que combates são hoje decisivos para enfrentar os problemas das pessoas?

Perante a gravidade da situação actual, temos que saber a posição de todas as pessoas e instituições com responsabilidades – Presidente da República, partidos (mais ou menos homogeneizados nos comentários ao presidente) e todos os intervenientes na vida pública.

Estamos portanto sintonizados noutra frequência. Tal como disse Carvalho da Silva, líder da CGTP, “o Presidente da República fala dos problemas mas não fala das suas causas. A crise não é crise para todos nem chegámos aqui por acaso. Ou seja, há práticas que vão desde uma distribuição injusta da riqueza até às práticas dos grandes grupos económicos, de gente que tem utilizado mecanismos para a acumulação de lucros, destruindo empregos e actividades produtivas. Isto não esteve no discurso do Presidente”. Disse ainda que o Presidente da República é “o primeiro actor político do país” e que por isso “tem mesmo que fazer política no sentido de ser exigente com as instituições e com a sociedade”.

É que os discursos redondos, mesmo que ruidosos e aparentemente estridentes, tantas vezes proferidos para responder a tácticas pouco mais que pessoais, não resolvem os problemas de demasiadas pessoas que já não podem esperar mais.

Os Precários Inflexíveis continuarão a lutar por medidas concretas que enfrentem a precarização das relações laborais, a chantagem do desemprego e os sucessivos ataques ao conjunto dos trabalhadores. Estamos portanto ao lado de muita gente que não aceita viver assim.

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