DESCONCERTAÇÃO SOCIAL: Mais precariedade, mais horas de trabalho, punição por falta, mais dias de trabalho, menos salário e mais desemprego
Numa altura em que até os números oficiais do desemprego chegam a máximos históricos, com mais de 1,2 milhões de desempregados, o governo português promove, de acordo com o memorando de entendimento da troika, um ataque sem precedentes às condições gerais do trabalho para milhões – o “acordo” entre patrões, governo e a UGT materializa-se em mais precariedade, mais horas de trabalho, menos férias, redução dos salários, penalização agravada das faltas e um ataque generalizado à contratação colectiva.
Mantendo a ideia errada de que a flexibilidade laboral, ou seja, a precariedade, reduz o desemprego, o Governo PSD-PP promete menos regulamentação às empresas. Comprovadamente, a precariedade não aumenta o emprego, mas tão-somente degrada-o e a quem trabalha de modo precário. Os números crescentes do desemprego fizeram nos últimos anos aumentar a precariedade e vice-versa. Quanto mais desemprego há, maior é a chantagem exercida por patrões para obrigar trabalhadores e trabalhadoras a trabalhar em condições precárias e ilegais. A resposta do governo? Legalizar a ilegalidade. Simultaneamente, quanto maior a precariedade laboral, maior o desemprego. As “flutuações” de mercado e o poder discricionário cada vez mais evidente de patrões para poderem despedir sem entraves quem trabalha levam precisamente a que haja mais despedimentos e mais desempregados.
INDIVIDUALIZAÇÃO CONTRATAÇÃO – BANCOS DE HORAS – FERIADOS – FÉRIAS – PONTES – HORAS EXTRAORDINÁRIAS
Num ataque à contratação colectiva, o governo fez aprovar a instituição de bancos de horas individuais, que podem chegar a mais duas horas de trabalho diário, até 150 horas extra por ano. Até agora, estas horas eram combinadas por contratação colectiva, sendo as horas compensadas em descanso equivalente às horas extra ou pagamento extra. As novas regras abrem agora a compensação dos bancos de horas através do alargamento do período de férias (Veremos porquê). Quando 75% dos trabalhadores de uma equipa ou secção aderirem aos bancos de horas individuais, estes acordos individuais podem estender-se a toda a equipa ou secção.
Os dias de “ponte” em que as empresas encerrarem poderão ser descontados nas férias ou ser compensados em outros dias de trabalho.
Num acto de falsa moralidade e de ataque bárbaro aos trabalhadores, o acordo permite aos patrões punir os trabalhadores que faltem em dia de ponte com até quatro dias de salário. Esta medida é um dos sinais mais evidentes da perspectiva que o actual governo tem sobre o trabalho: os patrões fazem um “favor” aos trabalhadores ao os empregar e, quais padrinhos benevolentes, têm o poder de punir e disciplinar. É a inversão histórica das realidades económicas do trabalho, deixando de se reconhecer a constatação óbvia de que são os assalariados quem dá a ganhar a riqueza aos patrões. Até segundo as próprias regras do liberalismo económico, não faz qualquer sentido que sejam descontados 4 dias de salário por uma falta a 1 dia de trabalho. A única justificativa para esta medida é a perspectiva ultra-conservadora de governo e patrões, com o selo da UGT, que acreditam que os trabalhadores têm o dever de se submeter aos seus patrões, sob pena de punição.
Penalizando severamente as faltas, o Governo simultaneamente deixa de premiar a assiduidade. Os três dias extra de férias associados à assiduidade durante o ano vão desaparecer. Dos quatro feriados eliminados: supostamente dois civis e dois religiosos, apenas se sabe com certeza que os dois primeiros – 5 de Outubro e 1 de Dezembro, datas de grande importância para a memória histórica do país, a Instauração da República em 1910 e a Restauração da Independência em 1640, deixam de ser feriados. Há grandes dúvidas sobre se a Igreja Católica em Roma aceitará que estes dois feriados (Corpo de Deus e 15 de Agosto) deixem de o ser, de acordo com a Concordata. Mais uma opção marcadamente ideológica de um governo que, respeitando os contratos financeiros fraudulentos e concordatas diplomáticas com instituições religiosas, rasga despudoradamente o contrato social que existia no país.
Os dias de férias, que serviriam como compensação para o banco de horas, passarão a incluir os fins de semana. Portanto, os 22 dias base de férias (tendo-se já perdido os 3 dias de assiduidade), que antes eram dias úteis pelo que na prática perfaziam um mês de férias, passam agora a totalizar apenas 3 semanas.
O pagamento de horas extra passa também a metade do seu valor, o que constitui na prática a abolição do horário de trabalho. Esta medida está de acordo com o anúncio feito há poucos meses por parte do governo de que já não é necessário ter afixado nos locais de trabalho o horário de trabalho e que a ACT não faria qualquer verificação desses horários. A remuneração extra auferida pelo trabalho feito além das 8 horas diárias baseia-se na justa perspectiva de que o trabalhador deve ter, além de 8 horas de trabalho e 8 horas de descanso, 8 horas de vida privada e social. Ao deixar de compensar as horas extraordinárias, este acordo assume que as suas motivações estão bastante longe dos interesses da população trabalhadora, constituindo esta medida apenas mais uma forma de corte nos salários, num país em que os salários são os mais baixos da Europa e onde as horas extraordinárias são muitas vezes a única maneira de equilibrar orçamentos pessoais e familiares. Também desaparece o descanso compensatório para as horas extraordinárias, assumindo o governo inequivocamente que as 8 horas de trabalho diárias não são para cumprir, recuando assim numa conquista histórica absolutamente inultrapassável na actual sociedade – a conquista da perspectiva de que trabalhadores e trabalhadoras são também seres humanos e têm todo o direito à sua vida pessoal e privada.
http://economico.sapo.pt/noticias/mais-flexibilidade-de-horarios-e-mais-dias-de-trabalho_139225.html
by
Todos os dias revolto-me mais um pouco. Com a desculpa da situação do nosso país. São-nos tirados direitos que tanto custaram a que nos dessem. Não serão estas medidas que farão o país crescer. Estas medidas permitirão sim, um maior fosso entre pobres e ricos. Lembro-me de um tempo em que o povo trabalhava desde sol nascer ao se sol pôr. Para poder ter pelo menos dinheiro para por comida na mesa. Mas lembro-me que o nosso país não era mais rico, nem o povo tinha mais condições de vida? Havia sim ricos, muito ricos! Como estes nosso governantes não olharem para a história e verem que o país só cresceu quando o trabalhador cresceu e ganhou direitos!