Entrevista a Vitalino Canas (o sr. Provedor)
Em entrevista ao Diário Económico, publicada no passado dia 08/08/2008, o sr. Provedor Vitalino Canas insiste no perfil cínico. Um homem de mil “ofícios” e mil ordenados, mas que acha tudo compatível. Um homem que, ao mesmo tempo que é (entre muitas outras coisas) porta-voz do PS, abraça agora a importante função de legitimar e dar um ar normal e legal à intensificação da exploração no trabalho e aos abusos das Empresas de Trabalho Temporário (ETT). Um homem pronto para entrevistas, porque tem muita gente para convencer e salários para justificar.
Propõe um “Observatório do Trabalho Temporário”. Fala em “duas dezenas de processos” desde que entrou em “funções” – é preciso, realmente, procurar muito pouco… – e acha, pelos vistos, natural que a maioria d@s trabalhadore/as “não pretendem assumir nenhum conflito” e “até solicitam o anonimato”. É que o sr. Provedor não está cá para contrariar a chantagem do desemprego e da precariedade – Vitalino está ao serviço dos exploradores e por isso é pago. Nem mais. De caminho mostra-se empenhado no mais difícil dos exercícios: “mostrar indepedência” das ETT.
Partilhamos apenas algumas passagens, para não aborrecer leitores nem ocupar o demasiado o nosso blog com a demagogia servil de quem acha que as nossas vidas podem ser sacrificadas pelos interesses deles.
Pergunta óbvia, resposta insuficiente mas contente:
“Quantas denúncias recebeu de trabalhadores ao longo do ano?
Temos neste momento cerca de duas dezenas de processos… Temos tido alguns processos de trabalhadores que não são em rigor temporários, designadamente em regime de recibo verde que, apesar de não se inserirem na nossa competência, temos procurado ajudar. Temos também verificado que, muitas vezes, os trabalhadores que recorrem a nós não pretendem assumir nenhum conflito. Fazem um pedido, mais no sentido de serem informados sobre os seus direitos, para poderem junto da sua entidade patronal invocar uma opinião que obtiveram do Provedor. Muitas vezes até solicitam o anonimato, ou seja, que não se faça nenhuma diligência junto da empresa.”
Pergunta importante, resposta difícil de perceber (ou será que o problema dos patrões afinal é a matemática?):
“Quais os temas mais suscitados pelos trabalhadores de trabalho temporário?
Estão relacionados ou com cálculo de salários ou com férias, com subsídios… tendo em conta que os trabalhadores temporários por vezes trabalham por pouco tempo, isso torna de certa forma difícil calcular os subsídios de férias… há casos variados.”
Pergunta compreensível, resposta sem ética (para variar):
“O provedor tem a possibilidade de avançar com estes casos para tribunal com o interveniente?
Não. Primeiro, porque como Provedor intervenho a pedidos dos trabalhadores nos processos, não posso depois intervir como advogado. Isso seria eticamente muito condenável. Podemos é aconselhar o trabalhador a seguir esta ou aquela via processual. Mas, na minha percepção, a melhor forma de resolver os problemas é através da negociação.”
Pergunta para encher, resposta cheia de boas intenções:
“Os trabalhadores estão bem informados sobre a figura do Provedor?
Ainda não existe essa informação, pelo menos com a dimensão que eu pretendia. O Provedor tem sido divulgado sobretudo através da comunicação social.Queria concretizar uma maior divulgação por parte das empresas. Encontrar novas formas de divulgação, talvez para o período depois das férias. Queremos separar a página online do Provedor da página da APESPE, também para dar maior mostra de independência.”
Pergunta para uma resposta previsível (ou esperavamos que o sr. Provedor nos falasse do salário que recebe da APESPE para defender os seus interesses?):
“O Provedor defende os trabalhadores temporários, incluindo os da APESPE. Sentiu algum tipo de pressão?
Está bem esclarecido que o provedor não tem nenhuma função de defesa das empresas ou da associação. Não vejo porque é que em relação ao provedor do Trabalhador Temporário a questão da pressão se possa colocar. Nunca senti, por exemplo, que em relação aos órgãos de comunicação social, houvesse dúvidas em relação à independência do provedor.”
Pergunta um bocadinho mais difícil, resposta difícil de comer (e calar):
“Foi necessário um relatório da Comissão de Ética para esclarecer que não há incompatibilidade entre as funções de provedor e de deputado. A polémica suscitada pelo PCP pode ter desvirtuado as suas funções?
Reagi de forma decidida contra isso, porque me parecia que havia uma politização, até partidarização, indesejável desta figura. Na altura, surpreendeu-me um pouco a violência dos ataques, embora saiba que há partidos e sectores político-partidários que não acreditam na responsabilidade social das empresas. Hoje em dia, talvez não reagisse com esse vigor, porque acho que não devemos deixar que estas figuras sejam envolvidas na luta político-partidária.”
Pergunta ingénua, resposta descarada (com expressa declaração de interesses):
“O Trabalho Temporário não corre o risco de, no futuro, poder vir também a ser penalizado como se prevê no Código do Trabalho, por exemplo, para o caso dos recibos verdes?
O Trabalho Temporário está sujeito a uma legislação muito estrita desde há algum tempo e que foi revista há pouco mais de um ano. Não me parece que nesta altura seja uma questãochave mexer na questão do Trabalho Temporário. Temos de ter noção de que há situações de precariedade mais perversas do que outras. É o caso dos recibos verdes, que não se pode comparar com situações como contratos a termo ou Trabalho Temporário.”
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