Impostos para os mais ricos

Após as propostas alemãs de há um ano, em que 51 milionários locais ofereceram-se a Merkel para uma taxação extra (10%) sobre os seus rendimentos, ressurgiram nas últimas semanas propostas de milionários para começarem a ajudar a pagar a crise, aumentando a “equidade” dos sacrifícios. Warren Buffet, considerado o terceiro homem mais rico do mundo veio apresentar a sua proposta de que se parasse de “mimar os super-ricos”. Esta semana 16 das mais ricas personalidades francesas apresentaram a Nicolas Sarkozy um apelo a que também aumentasse as suas contribuições. Em Espanha e em Itália há já propostas concretas para que isto aconteça.

Warren Buffet declarava vitorioso, há 5 anos no NYTimes “Sim, há luta de classes. Mas é a minha classe, a mais rica, que está a promover esta guerra, e está a ganhar”. Hoje vem propor perder umas migalhas da sua fortuna incalculável em nome da “paz social”. Em França, destaca-se o nome de Liliane Bettencourt, a mulher mais rica da Europa, como subscritora da proposta a Sarkozy. Há pouco menos de um ano a mesma foi acusada de – imagine-se! – fuga aos impostos.
Hoje chegou a vez dos super-ricos de Portugal se pronunciarem. Demonstraram, regra geral a sua prepotência e incompreensão, revelando mesmo alguns deles a indisponibilidade para “contribuirem” para um imposto sobre as maiores fortunas. O primeiro questionado sobre o tema, Américo Amorim, com uma fortuna estimada em 2,6 mil milhões de euros abriu os comentários com humor “Eu não me considero rico. Sou trabalhador“. A isenção deste imposto estaria assim à partida garantida para o homem mais rico do país. 
Joe Berardo afirma que “mais importante que essa contribuição é que os empresários que têm riqueza criem postos de trabalho no país”, silenciando à partida questões de fundo com tiradas populistas. 
Patrick Monteiro de Barros revela imediatamente o seu espírito empreendedor e negocial à proposta de uma taxação especial sobre os mais ricos “qual foi a contrapartida exigida? Não entendo a proposta.”. 

André Jordan, que sendo um dos homens mais ricos do país afirma “eu não sou milionário”, revela alguma visão com o comentário acerca deste imposto que “tem um valor simbólico grande”. Questionado pelo Jornal de Negócios sobre a possibilidade de ser chamado a pagar um imposto extraordinário, responde “sim, eu pagaria”. As considerações de André Jordan são particularmente interessantes e explicitam a natureza desta proposta, assim como a percepção da mesma pelos mais ricos por todo o Mundo. Primeiro, Jordan explica que o mais importante desta proposta é o seu valor simbólico. O maior objectivo é o seu simbolismo. Visam taxar apenas rendimentos colectáveis e declarados, isentando mobiliário e imobiliário. Aparentarão distribuir os sacrifícios pelas várias classes sociais, dissipando a atmosfera de crispação que grassa as sociedades sujeitas aos regimes de austeridade que têm servido exactamente para transferir dinheiro dos mais pobres para os mais ricos. Como se pode comparar o sacrifício de uma pessoa que deixará de estudar por causa dos planos de austeridade, que deixará de poder fazer um tratamento médico, que não terá o que comer por falta de dinheiro, com um imposto “simbólico” sobre uma pequena fracção dos bens dos super-ricos? É um paradoxo que só pode ser ilustrado pelo texto de opinião do editor do Sol “Fazer a mesma vida gastando metade“, onde se aconselha ” a escolher sempre um modelo abaixo daquele que normalmente iríamos comprar. Em vez de um Mercedes E, um Mercedes C; em vez de um Audi 6, um Audi 4; e assim sucessivamente”. Finalmente Jordan mostra na sua boa vontade a impunidade com os mais ricos vivem a sua vida, ao declarar que “sim, pagaria”. A toda a camada trabalhadores e mais pobre da sociedade são impostas medidas draconianas sem apelo nem agravo, mas André Jordan, no topo do seu poder económico, mostra-se disposto a contribuir para o sucesso desta medida simbólica aceitando beneplacitamente pagar um imposto. É de referir que André Jordan é conhecido por ser proprietário de algumas ‘offshores’ do BCP.
A elite financeira e económica mundial é a única razão pela qual existem ‘offshores’, cujo objectivo expresso é evitar que paguem impostos. Estes e outros esquemas, primeiro dos quais difundir até academicamente a teoria de que os mais ricos são os únicos criadores da riqueza e que como tal não devem ser taxados, são a razão pela qual existe tanta desigualdade nas sociedades. A fuga das camadas mais ricas à contribuição tributária é uma constante histórica, paralela apenas à cobrança coerciva de impostos aos mais pobres em cada sociedade. Agora, numa manobra publicitária recorrente, os mais ricos aparecem a clamar que querem contribuir. Ser-lhes-á taxada uma fracção irrisória da sua riqueza. E isso justificará taxar até aos ossos o povo.  A taxação extraordinária dos mais ricos deveria ter sido efectuada desde os primeiros dias desta crise. Deveria ter havido um contributo decisivo para reduzir o impacto da crise na vida das pessoas que pouco ou nada contribuíram para ela. Aconteceu o contrário. Hoje, é de temer que implementação deste imposto seja, mais que tudo, uma arma propagandística.
Facebooktwitterredditlinkedintumblrmailby feather