Iniciativa Auditoria Cidadã pede anulação da adjudicação da Auditoria às PPP na Procuradoria-Geral da República
Via Iniciativa Auditoria Cidadã
1) A 20 de Dezembro de 2011, através do procedimento nº 6124/2011, a Direcção-Geral do Tesouro e Finanças lançou um concurso público para os Serviços de auditoria contabilística/consultoria às PPP do Estado Português. Este concurso destinava-se à “aquisição da prestação de serviços de auditoria e consultoria às Parcerias Público Privadas do Estado Português (Administração Central), consubstanciada na identificação e avaliação dos principais e eventuais passivos e quantificação das responsabilidades financeiras por parte das Parcerias Público Privadas, bem como quaisquer outros montantes relacionados, que possam vir a ser pagos pelo Estado Português, relativos a responsabilidades contingentes, com quantificação dos respectivos montantes”. Tinha como valor referenciado 250.000 euros.
2) Participaram neste concurso a Universidade Católica, a Pricewaterhouse Coopers em conjunto com a Sérvulo & Associados, a Ernst & Young, a PKF Portugal e a BDO Portugal.
3) No dia 19 de Março de 2012 o Estado anunciou o vencedor deste concurso: a Ernst & Young S.A. por um valor inicialmente estimado de 250.000 euros. No dia 30 de Março o resultado do concurso foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia.
4) A adjudicação deste trabalho a esta empresa viola princípios fundamentais da contratação pública, designadamente os da boa-fé, seriedade, neutralidade e proibição do conflito de interesses consagrados na Constituição da República Portuguesa, nas Directivas Comunitárias e no Código dos Contratos Públicos.
5) A Ernst & Young S.A., assim como a sua empresa-mãe e accionista Ernst & Young Audit, realiza ou realizou revisão legal de contas para as empresas:
AdP – Águas de Portugal, SGPS, S.A.
Águas de Trás os Montes e Alto Douro, S.A.
Águas do Noroeste, S.A.
Águas do Zêzere, S.A.
Águas do Algarve, S.A. (e várias das empresas pertencentes a este grupo)
José Mello Saúde SGPS, S.A.
Somague SGPS, S.A.
ENDESA, S.A. (Endesa Capital Finance, L.L.C.; Endesa B.C)
IBERDROLA (Iberdrola Participações SGPS, S.A.; Iberdrola Portugal Electricidade e Gás, S.A.)
6) Estas empresas são participantes directas em consórcios para concessões e parcerias público-privadas (das 120 existentes, o Governo nunca definiu quais as 36 parcerias público-privadas e as 20 concessões a auditar). Estão envolvidas, entre outras, nos consórcios da Lusoponte (Somague), Auto-Estradas do Atlântico (Somague), Auto-Estradas Túnel do Marão (Somague), Hospital de Braga (José Mello Saúde) e Hospital de Vila Franca (José Mello Saúde), Barragens de Gouvães, Alto Tâmega, Daivões (IBERDROLA),Girabolhos (ENDESA), Águas de Trás os Montes e Alto Douro, Águas do Algarve, Águas do Noroeste, Águas do Zêzere e pelo menos mais 12 concessões na área das águas e ambiente/resíduos pertencentes ao grupo Águas de Portugal (Águas do Centro Alentejano, Águas do Douro e Paiva, Águas do Oeste, Águas de Santo André, Águas do Mondego, Águas do Norte Alentejano, Sanest, Simarsul, Simlis, Simria, Simtejo, Simdouro).
7) A mesma consultora realiza ainda auditorias e consultoria para empresas do Grupo Espírito Santo como BES – Companhia de Seguros, S.A., BES-Vida – Companhia de Seguros S.A., Gesfimo – Espírito Santo, Irmãos, Sociedade Gestora de Fundos Investimento Imobiliário, S.A.. Este grupo encontra-se associado a muitas outras parcerias publico-privadas que poderão estar sob auditoria, nomeadamente nas rodoviárias, barragens e de saúde.
8) Sendo que a empresa vencedora deste concurso público, a Ernst & Young S.A., trabalhou ou trabalha para as empresas que irá agora auditar, e constituindo tal facto um evidente e grosseiro conflito de interesses que poderá chocar com o objectivo proposto para o lançamento do concurso,
9) E sendo que as circunstâncias em que a consultora Ernst & Young S.A. desenvolverá a sua actividade de auditoria de contas colidem directamente com o Código de Ética da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas;
A Iniciativa Auditoria Cidadã à Dívida Pública solicitou ao Sr. Procurador-Geral da República que, como representante máximo do Ministério Público, utilizasse das suas prerrogativas constitucionais e providenciasse as diligências para averiguar este processo de adjudicação pública e solicitar o anulamento do resultado deste concurso.
Um Procurador do Gabinete do Procurador-Geral da República assegurou aos representantes da IAC da brevidade da resposta às solicitações. A IAC endossará esta exposição e documentação aos líderes dos grupos parlamentares na Assembleia da República, assim como à Comissão Parlamentar de Inquérito às Parcerias Público-Privadas dos Sectores Rodoviário e Terroviário.
Uma auditoria levada a cabo pela consultora Ernst & Young às PPPs e concessões servirá apenas para cobrir com um novo manto de opacidade o processo já absolutamente opaco que é a contratação pública de PPPs. Aceitar os resultados de tal auditoria significaria pôr em causa do interesse público não só actual, mas para anos futuros e para as futuras gerações, pois os contratos auditados estender-se-ão várias décadas.
Ironicamente, a adjudicação da auditoria às PPPs parece ser ela mesma uma PPP: opaca, parcial, marcadamente desequilibrada entre as partes participantes, com o privado a ser beneficiado e com conflitos de interesse latentes.