IX. O que quer o Governo? | Desvalorizar o trabalho

Diz o Governo de Passos Coelho e Paulo Portas, juntamente com exército nacional de destacados economistas liberais que hegemonizam a comunicação social com os seus discursos, prática que se mantém desde o Governo de Sócrates, que para a economia recuperar e o país sair da crise é necessário reduzir salários e direitos aos trabalhadores, pois estes andam a viver acima das suas possibilidades. Esta é a ideia que tem justificado e possibilitado, através de um conjunto de medidas de austeridade, uma brutal desvalorização do trabalho em prol dos interesses do capital financeiro e do aumento da exploração. Depois de Sócrates, o actual Governo dá hoje continuidade a este plano, mas agora com a desculpa perfeita da intervenção do FMI e da União Europeia para o intensificar.
 
O Governo PS impôs um corte de 5% nos salários da função pública em 2010 e fraccionou e atrasou ao máximo a subida do salário mínimo nacional (SMN) acordada em concertação social, em 2006, que previa um aumento gradual até 500€ em 2011. Actualmente o SMN é de apenas 485€ e o Governo PSD/CDS não prevê qualquer subida, aliás, há entre estes quem defenda a sua descida com o argumento da “competitividade” das empresas.

O Governo prevê congelamento de salários e pensões até 2013. Considerando que o conjunto das remunerações aos trabalhadores pelas empresas em Portugal representa em média 18% da totalidade das despesas e que os consumos intermédios (serviços externos e matérias consumidas) assumem uma importância média de 65%, facilmente constatamos que não são os salários que limitam a competitividade das empresas e que existem outras alternativas.
Mas o plano de desvalorização do trabalho não está a ser executado apenas de forma directa no salário. O fortíssimo ataque à Segurança Social que tem vindo a deteriorar diversos apoios sociais, como o apoio aos desempregados (subs. desemprego e subs. social de desemprego) e os abonos de família, representam formas indirectas desta desvalorização – é a degradação duma parte do salário e de direitos elementares, que além do mais pressionam o conjunto dos salários para baixo por via do aumento da chantagem social e da pressão do desemprego. Assim como as previstas privatizações de diversos serviços públicos (saúde, transportes, CTT, energia, etc.) que até hoje têm sido pagos com os impostos de todos nós (ou seja, com o nosso trabalho), possibilitando comparticipações diferenciadas consoante os níveis de rendimento, passarão a ser inteiramente pagos pelos nossos salários e portanto mais caros, além de escaparem ao controlo público e ao interesse geral.
Com todas as desculpas da crise, apesar de todo o discurso da inevitabilidade, sabemos que este projecto de desvalorização do trabalho representa uma perigosa regressão social. É um plano que encontra agora terreno fértil para se desenvolver, mas que corresponde a ambições que estão muito para lá da resposta à crise. É a esse projecto que o mundo do trabalho e o conjunto da sociedade terá de se opor para o evitar.
Facebooktwitterredditlinkedintumblrmailby feather