Lusa: Especialistas apontam inconstitucionalidades à proposta de revisão do Código de Trabalho
Para Jorge Leite, tanto o Código actualmente em vigor, como a proposta de alteração, “contêm várias inconstitucionalidades”, e dá os exemplos da comissão de serviço, do alargamento do período de experiência, ou a caducidade das convenções colectivas.
O jurista recorda que “a contratação colectiva é reconhecida como direito do trabalhador e não do empregador”, tendo por base o princípio de que as partes “não estão em igualdade de circunstâncias”. Mas esta alteração “prevê que a contratação colectiva também seja um direito do empregador”, defendeu apontando que o que “a Constituição consagra é o direito dos trabalhadores à contratação colectiva“.
Já para Gonçalves da Silva, as dúvidas de possível “colisão” com a Constituição estão relacionadas com o processo de despedimento, o qual considera que “era vantajoso manter-se como estava“, realçando que “não devia ser visto como um conjunto de actos dispersos”. “Tenho dúvidas se pode colidir com a Constituição”, disse.
O professor Jorge Leite lista ainda algumas críticas como o alargamento do período de experiência para seis meses o que “viola a estabilidade de emprego”, ficando um “empregador com mais vantagem em ter um trabalhador à experiência do que um com contrato a termo“.
“Este Código, através de um conjunto de normas, agrava em muito a adaptabilidade, que é excessiva, afectando a disponibilidade dos trabalhadores e a sua vida” além do emprego, defendeu Jorge Leite, salientando, que a proposta “admite que [a adaptabilidade] possa ser imposta mesmo contra a vontade do trabalhador e mesmo sem um instrumento por trás”, como a contratação colectiva.
Embora “para a generalidade dos trabalhadores a situação fique pior“, Jorge Leite reconhece que, em termos gerais, o conjunto das alterações propostas “não são totalmente contraditórias” com o objectivo de dar mais importância à família.
Quanto ao combate à precariedade do trabalho, “uma das bandeiras desta proposta”, Jorge Leite refere que “há algumas medidas que vão nesse sentido”, mas “o essencial mantém-se” e os exemplos passam pela existência, no próprio Estado, pela figura de ‘outsourcing’, ou seja, “adquire-se um serviço em vez de um trabalhador, o que é uma similação fraudulenta“.
Luís Gonçalves da Silva aponta, por seu lado, que entre os pontos positivos da proposta, está a flexibilidade em matéria de tempo de trabalho – embora seja “necessário garantir a efectiva realização da duração do tempo de trabalho sob pena de criar [situações] de conflitualidade” – e o apoio à família, com as melhorias nas licenças.
O especialista defende que esta é uma situação em que devia ser ministrada formação, após o regresso da funcionária (ou do funcionário) quando está ausente por um período mais longo, e reconhece a “necessidade de uma fiscalização muito forte” para assegurar a integração do trabalhador.
A tentativa de simplificação de procedimentos para as micro-empresas e PME é outro dos avanços que este especialista faz questão de frisar.
Gonçalves da Silva lamenta “a confusão lançada sobre os contratos a termo” que considera “um importante instrumento na criação de emprego, como atestam os dados do INE” (Instituto Nacional de Estatísticas).
“A formação devia ter sido reforçada” e o contrário “é um mau sinal”, por exemplo, nos contratos a termo, “onde devia haver uma aposta e não uma atenuação”.
Na contratação colectiva “continua a forte presença do Estado, quando devia ser dada maior responsabilidade aos parceiros”, ou seja, às empresas e sindicatos, até porque se trata de “um dos mais importantes instrumentos de flexibilidade do trabalho”.
O professor de Direito de Trabalho na Universidade Católica do Porto e ex-membro da Comissão do Livro Branco, Júlio Gomes, defende, por seu turno, que “esta não é uma reforma moderna” pois não trata determinados assuntos como o “trabalho equiparado”.
O jurista referiu o caso dos trabalhadores independentes (recibos verdes), que não têm dependência jurídica de uma empresa e, por isso, não têm determinados direitos na área social, como férias ou licença de maternidade.
Explicou que, em vários países da Europa este tipo de trabalhadores têm uma equiparação a um contrato de trabalho desde que exista dependência económica de uma entidade ou empresa.
Para o professor universitário e ex-membro da Comissão para o Livro Branco, António Casimiro Ferreira, esta reforma “deixa de lado um conjunto de elementos que deviam estar em articulação com o Código do Processo do Trabalho”, como mecanismos de protecção social, políticas de formação e de qualificaçãos dos trabalhadores, mas também a fiscalização de normas laborais (para tornar o direito do trabalhador mais efectivo).
Em declarações à agência Lusa, Casimiro Ferreira salientou ainda que ainda não foi analisado o impacto desta legislação na actividade dos tribunais, tanto no que respeita aos juízes como ao Ministério Público.
Por outro lado, defende que a proposta para o Código do Trabalho “não promove a negociação colectiva”, assistindo-se ao acentuar do individualismo no contrato de trabalho o que vai “precarizar ainda mais o movimento sindical“.
Tal como outros especialistas, Casimiro Ferreira salienta o alargamento do período experimental que considera levar a uma facilidade de contratar e despedir, “sem regras de restrição”, defendendo que o que está em causa é o custo do trabalho.
Por isso, para Casimiro Ferreira, este é um Código de Trabalho “favorável a empresas cuja actividade assenta em mão-de-obra pouco qualificada“, sublinhando que “as boas empresas não precisam deste Código”.
Quanto à competitividade e produtividade, Casimiro Ferreira considera que “não se resolvem no Código de Trabalho”.
“Há falta de boas práticas, mas não há responsabilização [nos casos] de más práticas empresariais”, acrescenta.
Já Gonçalves da Silva defende que o Código “dá passos importantes” no sentido da competitividade, como a flexibilização e a simplificação na relação com as entidades públicas. Mas na produtividade, segue a opinião de Casimiro Ferreira e defende que “é um erro eleger o Código de Trabalho como instrumento que vai resolver os problemas da produtividade”, embora seja um dos elementos que pode dar uma contribuição.
Para o jurista, Manuel Cavaleiro Brandão, a proposta governamental é “no geral, uma proposta positiva” mas precisa de corrigir “alguns lapsos”. “O texto em discussão “é técnicamente mais evoluído e refinado mas apresenta ainda uma série de dificuldades substantivas que carecem de rectificação”, disse o professor, que integrou a Comissão do Livro Branco das Relações de Trabalho.
Cavaleiro Brandão lembrou
à Lusa que o texto do Código do Trabalho foi integralmente redefinido, acabando por integrar “algumas alterações que não foram desejadas por ninguém”. “Julgo que há a intenção de rectificar esses lapsos”, disse.
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