“Muito deste trabalho é trabalho negro, isto é, trabalho que não é declarado.”

“Natal traz mais emprego, mas só até à época de saldos”, artigo do jornal Dinheiro Vivo, de Rafaela Burd Relvas, com declarações de João Camargo, da Associação de Combate à Precariedade.

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O Natal vai trazer emprego a milhares de portugueses sem trabalho. Mesmo que seja só até janeiro. 500 colaboradores para reforçar as lojas da Toys “R” Us, um aumento de 250% do total de empregados da marca. Part-times, para reforço de Natal, para as lojas C&A de todo o país. Colaboradores para a campanha de Natal do El Corte Inglés, em diferentes funções e diferentes horários. Operadores de embrulhos para a equipa de uma grande superfície comercial, com “capacidade de resistência ao stress”. Consultores de vendas a tempo parcial, para as lojas da H&M de Lisboa, Coimbra e Montijo, para maximizar as vendas das lojas, num ambiente com um “ritmo trepidante”. A lista continua e deixa adivinhar que a época natalícia arrancou muito antes de terem sido montadas árvores e luzes de Natal nas ruas e centros comerciais.

Este ano, a empresa de recrutamento Hays dá conta de um aumento, face ao ano passado, no número de recrutamentos associados à época de Natal e passagem de ano, com destaque para os sectores do turismo e hotelaria e o retalho. “Na área de turismo, os hotéis orientados para a realização de eventos são os que mais oportunidades oferecem. Já o retalho necessita de reforços para o período que antecede a época natalícia, seja para as lojas habituais ou para pop up stores que surgem apenas nesta altura do ano. Estas contratações prolongam-se, muitas vezes, até ao período de saldos”, nota Marta Santos, section manager da Hays Response.

O fenómeno, já se sabe, não é de hoje. Mas também não é da época. “O trabalho temporário, em geral, tem-se expandido de uma forma bastante agressiva, através de uma maior implementação das empresas de recrutamento para trabalho temporário, na sua maioria de fundo internacional e que têm sido muito apoiadas pelo próprio Governo, até a nível de facilitação de acesso ao IEFP”, diz João Camargo, membro da associação Precários Inflexíveis, em declarações ao Dinheiro Vivo.

Sobre a época natalícia, João Camargo refere que o trabalho oferecido é, normalmente, abusivo. “Muito deste trabalho é trabalho negro, isto é, trabalho que não é declarado. É simplesmente acordado por baixo da mesa e infelizmente, esta é uma parte muito significativa e que é impossível de contabilizar”. A verdade, continua, é que o nível do trabalho temporário que existe em Portugal “já é bastante assustador” e permite camuflar as formas de desemprego, através de termos como “subemprego”.

No final do terceiro trimestre, mostram os dados do INE, 232,1 mil empregados a tempo parcial, do total de 595,5 mil, estavam em situação de subemprego (ou seja, trabalhadores a tempo parcial que desejam trabalhar a tempo inteiro). O subemprego diminuiu 8% em relação ao trimestre anterior e 9,4% face ao trimestre homólogo, mas, por outro lado, a população empregada a tempo parcial também diminuiu 5% face ao terceiro trimestre de 2013.

E se os indicadores do INE mostram que as famílias estão mais otimistas face ao futuro – em outubro, o indicador de confiança dos consumidores atingiu o valor mais elevado dos últimos 12 anos -, os Precários Inflexíveis não esperam grandes mudanças. “As pessoas estão bastante desesperadas por acreditarem em alguma coisa e é natural que não possam estar sempre deprimidas. Mas, em termos económicos, não há razões para estar muito esperançoso, exceto na perspetiva de que é possível mudar a situação atual”.

Ainda assim, conclui João Camargo, “todas as propostas que existem e que estão a ser implementadas para mudar o mercado de trabalho são no sentido de piorá-lo: ou legalizar o que era ilegal, que é o mais comum, ou lançar grandes projetos, como estágios profissionais que durem um ano”.

 

 

 

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