Não é só o DN que o diz
Nunca houve tantos empregos precários
MANUEL ESTEVES
Os números do Instituto Nacional de Estatística (INE) são categóricos: nunca houve tanta gente com contratos de trabalho instáveis. Em 2007 eram 873 mil, ou seja, 22,4% do universo de trabalhadores por conta de outrem.
Em dez anos, o conjunto de pessoas com vínculos laborais precários cresceu 47%, a um ritmo anual de 3,9%. O emprego sem termo, por seu lado, cresceu neste período pouco mais do que o trabalho precário em cada ano: 5,9%.
A maioria dos 873 mil precários tem contratos a termo: são 685 mil pessoas, quase todos empregados a prazo, vivendo sem saber como vão pagar a renda dentro de três, seis ou 12 meses, caso a empresa não renove o contrato ou não as integre no quadro.
Mas ainda há pior do que isto. São os chamados “falsos recibos verdes”, que o INE estima em 188 mil: pessoas que fazendo parte do normal funcionamento de uma empresa e estando sujeitas a horário e à subordinação hierárquica recebem o seu salário como se fossem simples prestadoras externas de serviço. Ou seja, a empresa não tem qualquer compromisso com o trabalhador, podendo abdicar dos seus serviços a qualquer momento.
Os patrões são maus?
Se trabalhar a prazo ou a recibos verdes é tão prejudicial para os trabalhadores, porque insistem as empresas neste tipo de vínculo? Não é uma questão de maldade, mas sim de defesa dos seus interesses. A Confederação da Indústria Portuguesa – principal representante dos patrões – lembra a importância da contratação a prazo como resposta às necessidades transitórias das empresas. Mas os patrões argumentam também que são empurrados para a contratação a termo pela rigidez da legislação laboral. É muito difícil despedir trabalhadores que se revelem incompetentes ou irresponsáveis. E por isso, por via das dúvidas, mais vale contratá-los a prazo, alegam.
E a legislação é assim tão rígida? A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico garante que sim, colocando Portugal no topo do ranking dos países onde é mais difícil despedir. Mas se é assim tão difícil despedir, como se explica que o número de desempregados tenha duplicado em apenas quatro anos? Com efeito, Portugal é um dos países onde a taxa de desemprego em Portugal é mais volátil e sensível aos ciclos económicos, uma característica dos países onde a legislação laboral é mais flexível, como os Estados Unidos.
Da lei à prática…
É porque a lei não é aplicada, respondem em uníssono as centrais sindicais. A fiscalização é ineficaz e os meios da Autoridade para as Condições de Trabalho, insuficientes. Mas há outras razões. A rigidez da legislação em matéria de despedimentos é uma meia verdade. Ou uma meia mentira. Despedir um trabalhador isoladamente é difícil, senão impossível em alguns casos. Mas despedir um conjunto de trabalhadores, sob a figura do despedimento colectivo, é mais fácil em Portugal do que na maioria dos países, garantem todos os especialistas.
Preocupado com o crescimento de um mercado de trabalho paralelo, ditado pela precariedade, o Governo apresenta, esta semana, o seu plano de alteração ao Código do Trabalho onde as regras da contratação serão alteradas. Falta saber como.