Opinião de Mário Contumélias: mais uma voz contra a precariedade e o Código do Trabalho

Recuperamos aqui mais uma pertinente e certeira opinião de Mário Contumélias, publicada ontem no Jornal de Notícias:

O bando dos 4

O Governo fez aprovar na Assembleia da República a nova legislação laboral. O primeiro-ministro celebrou mais uma “vitória política” e diz que o Código, agora aprovado, reduz a precariedade porque os contratos a prazo descem de seis para três anos e os empregadores passam a ter de efectuar descontos, sobre os recibos verdes.

É um ponto de vista que o Precariado não partilha. Os “Precários Inflexíveis”, num recente panfleto, dizem exactamente o contrário, que a nova legislação, feita “com o acordo dos patrões e as mentiras do Governo”, vem “acabar com direitos antigos e legalizar as novas formas de exploração”. Têm razão.

Em Portugal, via de regra, os governantes parecem pensar que os problemas dos trabalhadores se resolvem liberalizando o mercado. Se a produtividade é baixa, não passa pela cabeça de ninguém pedir responsabilidades aos gestores, pôr em causa a qualidade da gestão, cuidar de implementar uma maior democraticidade laboral, a exemplo do que acontece noutros países, igualmente capitalistas.

Se a produtividade é insuficiente, a explicação é simples – a responsabilidade é dos trabalhadores, da sua impreparação, do seu laxismo. Esquece-se que, por esse mundo fora, os portugueses trabalham e produzem ao mais alto nível; portanto, se, por cá, não acontece assim, algumas razões haverá, que os transcendem.

O novo código laboral de Sócrates não se afasta desta visão. Traduz-se na legalização dos recibos verdes e do trabalho intermitente, e alarga ainda o período experimental de trabalho. E se os contratos a prazo descem para três anos, isso quer dizer que os empregadores passarão, tendencialmente, a aumentar a rotatividade na ocupação do posto de trabalho, e não que integrarão obrigatoriamente os trabalhadores no quadro das empresas, findo o período contratual.

De tudo isto decorre que a nova legislação laboral é, de facto, amiga e incentivadora da precariedade, que não resolve antes contribui para instituir. Não terá sido por acaso que Manuel Alegre e três deputadas do PS votaram contra este código, infringindo a disciplina partidária. Mas foi bom. Ficámos a saber que, entre os deputados do PS haverá, pelo menos, quatro socialistas. Cabem todos num táxi, é certo, mas são uma espécie de “Bando dos 4” de cariz positivo, que ajuda a manter viva a esperança.

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