Opinião :: Na Grécia ensaia-se a proposta dos governos para um novo equilíbrio social

Na Grécia como cá, aí estão os governos de braço dado com os banqueiros, a alta finança, as instituições reguladoras (FMI, BCE), os patrões… todos juntos a proporem retrocessos de dezenas de anos. Devemos nós aceitar como inevitável o roubo do 14º mês? Devemos acreditar que mais nada há a fazer na economia e pela justiça laboral e social senão trabalhar mais, ficarmos cada vez com menos opções de vida e vender-nos logo nos primeiros anos de juventude aos bancos para poder estudar ou poder alugar um quarto com mais alguém, para ter um mínimo de independência?

Claro que não. São os responsáveis pela crise financeira e social que nos propõem a inevitabilidade das dificuldades, fundando o núcleo do seu discurso na responsabilidade da maioria das pessoas no germinar da crise. Dizem que vivemos acima das possibilidades. Quem vive acima do necessário? Os precários? Os milhões de pobres? Os pensionistas que ganham menos de 300 euros? Os jovens que pedem empréstimos para estudar e têm de deixar os estudos para trabalhar e pagar os empréstimos?

Os governos permitem, como em Portugal Sócrates permite, que em 2009, 12,6 mil milhões de euros de meia dúzia de pessoas voe para três dezenas de offshores, como as ilhas Caimão ou Jersey. Descontados já os 11 mil milhões que regressaram, o dinheiro estacionado em paraísos, ao abrigo dos olhares indiscretos do fisco, foi de 1,6 mil milhões de euros, mais de 1% da riqueza gerada no País. Ou seja, uma imensa quantidade de dinheiro que não paga qualquer imposto.

Os governos permitem o uso e abuso da figura de “lay-off” que lesa os trabalhadores (que recebem menos e não podem ter acesso ao subsídio de desemprego) e a Segurança Social, que se vê obrigada a pagar boa parte do salário do trabalhador. Enquanto isso, na Quimonda por exemplo, os trabalhadores em funções foram obrigados a trabalhar mais 4 horas por turno, de 8 horas para 12 horas. Estamos portanto a falar de uma empresa que é detida e administrada pelo Estado Português (através da AICEP), pelo BES e pelo BCP.

Os casos de pessoas (e sempre a Segurança Social) a serem penalizados pela ilegalidade e entrusamento entre governos e empresas aumenta todos os dias. Grandes empresas como a Maconde ou a Leoni também usaram de forma ilegal o “lay-off”.

Ao mesmo tempo, e noutra frente de roubo social, o governo, através da CGD, enterrou na lama do BPN um valor que vai chegar aos 4,5 mil milhões de Euros. Não é este dinheiro que servirá para segurar as poupanças de quem trabalha. Representa antes, uma ajuda sem qualquer garantia aos especuladores que procuraram e procuram o lucro acima do lucro, que jogaram nas regras que eles próprios definem. Hoje, quando o tabuleiro caiu ao chão, meteram a mão no bolso do Estado, ou seja, de todos nós… e o governo ajudou, abriu, ainda abre hoje o bolso um pouco mais para que não haja dificuldade em rapar o que ainda vai havendo nos cofres públicos.

Na Grécia como cá, os governos de centro e direita estão a preparar-se para propor o aumento dos impostos, o corte de salários públicos (e claro, privados) e o aumento da idade da reforma para 67 anos. Em Bruxelas, ou seja, os tais responsáveis e líderes de sempre (antes, durante e depois da crise) continuam a exigir à Grécia mais medidas de contenção, podendo estar em causa o fim do 14º mês de salário.

Hoje na Grécia os trabalhadores estão em luta, e se fosse possível estar lá hoje com eles, lá estaria. A Frente Militante de Todos os Trabalhadores apelou à realização de manifestações de outras organizações sindicais. A greve deverá provocar o encerramento de escolas, serviços públicos e tribunais, enquanto os bancos, hospitais e grandes empresas do sector público estarão a funcionar a “meio gás”. O país está também privado de informação noticiosa das rádios e televisões devido à greve convocada pelo sindicato dos jornalistas. Os jornais não deverão hoje aparecer nas bancas.

Os protestos foram convocados pela poderosa Confederação Geral de Trabalhadores gregos (GSEE, com um milhão de associados). A Confederação dos funcionários Adedy (300 000 associados) – que representa a camada mais afetada pelas medidas de austeridade, nomeadamente com cortes salariais – apelou aos seus associados para que se juntem a esta nova greve, depois do primeiro protesto, de 10 de Fevereiro.

Estamos a viver um tempo de requilíbrio dos pratos da balança, de um lado quem trabalha, do outro quem explora o trabalho e as vidas dos outros. Hoje não nos daremos ao luxo de nos demitirmos desta luta.

Pelo contrário, vamos empregar tudo o que tivermos, investir aquilo que não temos, sonhar com o que queremos, e vamos cerrar as forças todas que conseguirmos juntar para resistir, e para propor um novo equilíbrio que sirva, antes de tudo, à maioria das pessoas.

rUImAIA

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