Opinião: Precariedade Estatística

Os EUA são vistos, dependendo da existência ou não de graves “cataratas mentais”, como um modelo daquilo que deve ser feito e também daquilo que não deve ser feito. Uns olham para o outro lado do Atlântico como olhos de júbilo, desejo e prazer, enquanto outros, como eu, olham para o Atlântico com ternura, em jeito de agradecimento pela distância que forçosamente nos mantém relativamente a um país que prova que Portugal pode sempre cair mais profundamente.
Ontem saiu a notícia-bomba; a Lusa noticiava um relatório da UE que diz que Portugal é um país de desigualdades profundas no que respeita à distribuição daquilo que é produzido, da riqueza do país, que, antes de mais, é preciso saber que não cai do céu, é gerado pelo trabalho, ou melhor, pelos trabalhadores.

Rapidamente o governo de Sócrates se apressou a dar indicações ao INE: “É pá! …manda aí umas estatísticas novas… mais favoráveis”. O mais engraçado é que podiam ter feito tudo em segredo, na mentira, como habitual, mas não. Disseram à boca cheia que pediram ao INE para enviar novas estatísticas para a UE para que a posição de Portugal fosse corrigida. E dizia um responsável governativo: “Portugal não está tão em baixo, não é bem assim”. Lindo! Caricato! Não somos o último, somos o penúltimo, ou talvez o ante-penúltimo. Muito melhor.

Nos EUA a situação é parecida, não sei se são eles que nos seguem ou nós a eles. Mas há poucos dias saiu uma notícia no jornal Expresso que falava de coisas bastante semelhantes. O título é “Estatísticas oficiais “escondem” recessão prolongada”. O sub-título é esclarecedor e exemplificativo da proximidade ideológica que liga os nossos governantes e empresários ao main-stream americano:

Se fosse adoptada a metodologia em vigor nos anos 1980 e 1990 para apurar os números da economia dos Estados Unidos, a inflação estaria entre os 7,3% e os 11,5%, o desemprego nos 13% e a economia em recessão desde o primeiro trimestre de 2005.

A pergunta que fica no ar é óbvia: e se cá também fosse adoptada uma metodologia que mostrasse a verdadeira face da precariedade, da pobreza, da exclusão, e do fosso social entre ricos e pobres, entre patrões e empregados?

A ter em atenção o estudo coordenado por Alfredo Bruto da Costa. Não foi encomendado pelo governo e não esteve sujeito a nenhuma direcção nomeada (pelo governo) e colocada no INE.
Entrevista com Alfredo Bruto da Costa no Público.

rUImAIA

Facebooktwitterredditlinkedintumblrmailby feather