Opinião :: Sócrates e o silêncio de quem sabe que está a roubar
José Sócrates e Helena André (Ministra do Trabalho e Solidariedade) fizeram há poucos dias uma demonstração criminosa daquilo que pretendem para o país. E se por vezes nos excedemos nos comentários a determinada situação, no calor da luta social e do sentimento da injustiça, esta não é uma dessas situações. Fazer crianças crescer num ambiente de trabalho, anular a vivência social de bébés e crianças dos 3 aos 5 anos, implementar socialmente vidas de filhos sem pais e pais sem os filhos é criminoso, deveria e poderia vir a ser objecto de processo no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Sócrates não defende horários de trabalho humanos e que permitam uma vida social digna. Por isso demite-se de defender trabalho com direitos e encarrega-se pessoalmente da exploração máxima e da retirada de todos os apoios para quem já é explorado.
Sócrates e a sua Ministra do Trabalho e Solidariedade inauguraram uma creche do Grupo Auchan (Jumbo) que funciona das 7h da manhã até às 00h30 e exclui as crianças de 6 meses, 1 ano e 2 anos. O Grupo Auchan sabe bem que é nessa fase (0-2) que as mães e os pais mais tempo precisam de dispender com as crianças, presencialmente. Para além disso, é do domínio público a perseguição laboral às mulheres grávidas e a dificuldade crescente, na prática, de exercer direitos de parentalidade. Portanto, o sinal é claro, o grupo Auchan não quer ter nada a haver com trabalhadoras grávidas, antes sim, quer ter precárias e precários que não tenham desculpa para não trabalhar recebendo salários mínimos até à 00h30, entregando os momentos familiares da tarde, do jantar, da história de encantar e do carinho nocturno com os filhos bebés ou crianças a alguém que provavalmente também será precário. Os trabalhadores acompanharão os filhos para casa, a dormir. No dia seguinte, um novo dia, crianças na creche (o dia todo?), trabalho precário para os pais. Vida de filhos sem pais, e pais sem filhos. Estado Social, diz José Sócrates. Mas diz também, “Reforma grande mas silenciosa”, ele bem sabe porquê, sabemos bem porquê. Quem rouba vidas, esperança e opções não pode orgulhar-se disso e bradar aos céus.
O PM enalteceu a responsabilidade social do grupo Auchan. Mas o grupo Auchan são milhares de pessoas com horários rotativos, nocturnos, mal pagos e precários, pessoas transformadas em escravos de outrém, mas modernos. No entanto, esta é a visão de Estado Social que Sócrates partilha com o PSD e CDS, por isso não se ouviram quaisquer críticas à direita. Eles estão de acordo.
Quando a Ministra Helena André, na sua candura irresponsável, diz que o país não poderia ter uma resposta social tão forte se não fossem os investimentos privados como o do grupo Auchan, está inconscientemente a decretar o futuro (infeliz) das crianças que nascerão e viverão no local de trabalho dos pais, neste caso, num centro comercial. Crianças que conhecerão muito bem e interiorizarão muito bem, desde que nascem, o significado de estar no local de trabalho a qualquer hora, ganhar pouco, ser precário e servir para pouco mais do que enriquecer grupos de gatunos que se organizam para explorar pessoas. Neste caso, os gatunos donos do Grupo Auchan.
Mas este grupo de bandidos (José Sócrates e Helena André) que envergonha a palavras Socialista, Estado Social, Solidariedade, Democracia, bem como envergonha todas as pessoas que sequer de forma ligeira se possam identificar à esquerda, esqueceu-se de explicar porque motivo esse Estado Social é implementado pelo grupo Auchan em zonas nobres da precariedade, ou seja na Amadora, Almada, Alfragide, Matosinhos e Maia. O grupo Auchan vai construir várias novas creches pagando o Estado, ou seja, nós, 4 Milhões de Euros da enaltecida responsabilidade social do grupo Auchan.
Já em Torres Novas, o PM inaugurou a Creche de São José (o Estado Social de José Sócrates só é laico nos dias de festa da demagogia). Esta IPSS beneficiou de 282.890€ (40% do total) de apoio do Estado (pelo Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais – PARES) e contará com um subsídio anual da Segurança Social de 190.000 €/ano, o que parece muito bem do ponto de vista das prioridades do Estado. Mas será que são Creches das IPSS são públicas, ou seja, pagas com os nossos impostos (são), e acessíveis a todos pelo menos, de forma tendencialmente gratuita? Não. O que significa que a maioria dos pais continuarão a ter de pagar para poderem ter os filhos nas Creches do “Estado Social” de José Sócrates e ao mesmo tempo a pagar a renda de vários actores privados que já perceberam que o Estado Social está em saldo. José Sócrates está a vendê-lo em bocados e rouba o que não lhe pertence.
rUImAIA
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