Patrões querem impor perda de direitos na sequência da ação da ACT para os falsos recibos verdes

Foi recentemente realizada pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) uma ação que resultou na notificação de quase 10 mil empresas para que regularizem as potenciais situações de falsos recibos verdes, que abrangem mais de 17 mil pessoas. A Associação de Combate à Precariedade – Precários Inflexíveis congratula esta ação, vem denunciar a chantagem que os patrões já estão a exercer, e espera que este processo seja levado até ao fim.

Esta ação é hoje possível, fruto de uma longa luta pelo combate à precariedade, que viu na aprovação, em 2013, da Lei de Combate à Precariedade, uma porta para um combate mais efetivo. Sempre se soube que não bastava a lei estar aprovada, eram precisos mecanismos que permitissem uma fiscalização mais ágil, e por isso, sempre reivindicámos que era necessário haver interconexão de dados entre a ACT, o Instituto da Segurança Social e a Autoridade Tributária, permitindo uma deteção muito mais célere de situações laborais que pareçam configurar uma relação de trabalho dependente, mas que está dissimulada como falso recibo verde, ou outro tipo de vínculo precário. Apenas no ano passado, 10 anos depois da aprovação desta lei, esta possibilidade passou a estar prevista na lei. Neste curto espaço de tempo, já permitiu a deteção de milhares de contratos de trabalho a prazo com renovações para além dos limites legais, e de falsas prestações de serviço para plataformas digitais.

Com a possibilidade desta interconexão, a ACT conseguiu agora chegar às empresas que acumulam mais de 80% da atividade dos seus prestadores de serviços, ou seja, os potenciais falsos recibos verdes. Deste universo retirou milhares de pessoas (quem também tem uma relação de trabalho por conta de outrem, pensionistas, quem tenham auferido menos de 12 salários mínimos) e notificou as restantes para que “verifique da regularidade dos vínculos laborais existentes e, sendo o caso, regularize-os”.

Como era expectável, as reações já se fizeram ouvir, levantando-se vozes contra esta ação e pondo até em causa a própria intervenção da ACT. No campo das empresas já começou a chantagem para que estes trabalhadores e trabalhadoras aceitem contratos que preveem salários muito abaixo do que têm recebido sem o reconhecimento da antiguidade da relação laboral. Chegaram também relatos de empresas públicas notificadas, mas como as respetivas administrações não foram autorizadas pelo Ministério das Finanças a regularizar as situações precárias, simplesmente cancelaram a prestação de serviços. A ACP – PI pediu já uma reunião com a Inspetora-Geral do Trabalho, Dra. Maria Fernanda Campos, para avaliação deste problema e eventuais soluções que protejam os trabalhadores e as trabalhadoras.

O grande passo desta lei esteve precisamente no reconhecimento de que não basta a legislação prever o direito ao contrato de trabalho: a precariedade é o regime da chantagem e da arbitrariedade patronal, por isso é necessário que existam mecanismos que assegurem o acesso aos direitos, protegendo quem está numa situação vulnerável e não pode arriscar o trabalho.

Como sempre afirmámos, a ACT tem um papel particularmente importante para concretizar na prática os avanços legais em matéria de precariedade. A efetiva aplicação dos mecanismos de reconhecimento da existência de contrato de trabalho depende do empenho no acompanhamento e fiscalização, para que se garanta que a lei sai do papel e entra, de facto, na vida real das pessoas. Cabe ao governo (neste caso ao próximo governo) garantir que há condições materiais para que este trabalho seja feito, e que é feito até ao fim. O combate à precariedade tem de ser um compromisso real com as pessoas e não apenas uma bandeira eleitoral.

Aos e às trabalhadoras que se veem confrontadas com propostas de contrato de trabalho que não asseguram os seus direitos previstos na lei, apelamos a que contactem a ACT expondo o seu caso.

A ACP-PI não deixará de intervir no sentido de denunciar os abusos sobre trabalhadores e trabalhadoras precárias e estará atenta ao desenvolver desta atividade inspetiva, que terá necessariamente de acautelar que todos os falsos recibos verdes existentes neste universo são regularizados sem perda de direitos, que os processos aos quais não se obteve resposta, ou sobre os quais recaem dúvidas, são alvo de inspeção por parte da ACT, e se nela se verificar a confirmação da existência de indícios de laboralidade, então, iniciar os devidos procedimentos de regularização.

 

Se a empresa para a qual trabalhas está a pressionar-te para aceitares condições piores do que as que te são devidas, faz queixa à ACT e envia-nos o teu testemunho (por mp ou para precariosinflexiveis@gmail.com)

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