Relatos da insurreição turca (1)
Neste momento há um estado insurrecional na Turquia. Um protesto que começou por ser a defesa de um parque público que seria destruído para construir um centro comercial transformou-se numa luta encarniçada pela democracia e pelo derrube do governo de Erdogan. Zeynep, uma activista turca da Associação de Combate à Precariedade que esteve até há pouco tempo em Portugal, está desde o primeiro dia na Praça Taksim, centro dos protestos, e envia-nos o seu testemunho na primeira pessoa.
“Ocupámos a Praça Taksim e as pessoas foram para o bairro de Besiktas para ocupar o gabinete do Primeiro-Ministro. Neste momento Taksim está ocupada e é nossa, com muita felicidade e animação dentro das barricadas que erguemos a toda a volta com autocarros, carros da polícia e vários materiais. A população destes bairros que rodeiam o parque está toda aqui, desde crianças a idosos, pessoas de vários quadrantes políticos, unidos nesta insurreição. Estamos aqui há seis dias, mas a violência agravou-se particularmente a partir do dia 31 de Maio. A imprensa nacional não mostra nada do que se está a passar nas ruas da Turquia, pelo que a informação do que se estava a passar aqui foi transmitida principalmente através das redes sociais. Nesse dia parecia que a polícia nos queria matar: estavam a usar armas de gás lacrimogéneo e disparavam-nos também as cápsulas, que são muito pesadas e que feriram muitas pessoas (geralmente na cabeça, que era para onde eles apontavam). Um professor da Univerdade Técnica Yildiz, o Dr. Burak Unveren, foi atingido na cara e perdeu um olho. Perante estes violentos ataques a população respondeu saindo às ruas em massa, centenas de milhares de pessoas. No parque nós estivemos literalmente a combater e a resistir à polícia, e reocupámos o parque passadas 35 horas do início do ataque. Ao mesmo tempo começaram a surgir protestos em cidades por todo o país, desde Istambul, para Ankara, a capital, Izmir e muitas outras, por todo o país [fala-se na imprensa internacional em 235 manifestações por todo o país]. A polícia utilizou de extrema violência em todo o país, e as pessoas responderam com mais e mais gente aderindo aos protestos na rua. Neste momento os protestos tornaram-se principalmente num movimento abrangente contra o Primeiro-Ministro Erdogan e o seu partido. Ontem à noite a Praça Taksim estava cheiíssima, animada e muito pacífica, mas em Besiktas a polícia atacou brutalmente. Mas ainda assim as pessoas mantêm-se em Besiktas com muita força, resistindo a cargas policiais, canhões de água e gás lacrimogéneo, montando barricadas. Estou em Istambul mas tenho recebido alguma informação sobre Ankara (a capital) que é muito má. A polícia está a ser ainda mais violenta aí, com utilização de balas de borracha, muita gente ferida com seriedade e prisões por todo o lado. Em Adana e Izmir a situação também é bastante violenta. Apesar da polícia, gás lacrimogéneo e a violência usada contra a população, cada noite há mais gente nas ruas, e ontem à noite estavam centenas de milhares a protestar por todo o país. Além dos manifestantes que estão em Besiktas, há muitíssima mais gente nas ruas gritando contra o primeiro-ministro e o seu partido. Os habitantes dos bairros estão nas ruas e a apoiar todo o movimento, abrindo as portas das suas casas, dando-nos limões [para o gás lacrimogéneo] e medicamentos para os ferimentos. Sentimos mesmo que há um levantamento popular, embora não saibamos o que vai acontecer. Estamos a resistir e a gritar em todas ruas contra o partido do governo. Podemos ver o nosso poder real na união que está a gerar na sociedade, nas comunidades. Acreditamos que podemos parar a polícia, que podemos fazer cair o primeiro-ministro também. Estamos todos com bastantes problemas respiratórios, porque o gás lacrimogéneo atacou os nossos pulmões. A DISK e a KESK [principais centrais sindicais] vão anunciar a Greve Geral hoje às 16h.”
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Para quando manif de solidariedade em Lisboa?