Somos reféns de quem?
Na televisão, opinadores chegaram a gritar “o país está refém dos piquetes!”, enquanto exigiam a tal “autoridade”, ou seja, repressão. A direita, silenciosa primeiro, pediu as bastonadas já tarde, quando já não havia ninguém para bater. Sócrates estava avisado e quis evitar coisas que fizessem lembrar buzinões, estudantes ou a Marinha Grande dos 90’s.
É verdade que este protesto revelou várias dimensões, no mínimo, discutíveis e contraditórias. Não se deve ignorar que vimos patrões (dos camiões) a usar trabalhadores/as para fazer o “seu” bloqueio – o que é ilegal e ilegítimo. E este Governo, que não dispensou de carregar sobre piquetes de greve a sério há bem pouco tempo, escolheu o “diálogo” agora. Diálogo que estava, durante a “crise”, a ser feito com uma associação (a ANTRAM) que devia representar o sector, mas afinal não era representativa.
Mas este bloqueio coloca questões muito mais importantes. Desde logo, demonstra brutalmente como as nossas vidas dependem do petróleo, que além do mais está em poucas mãos. Mas há outros “monopólios” que ficam à vista: a distribuição de alimentos já não é assegurada regionalmente, porque são os grandes retalhistas – concentrados em Aveiras ou noutros locais perto de outra qualquer auto-estrada – que mandam. É por isso que “as prateleiras dos supermercados ficaram vazias”. É por isso, ironicamente, que meia dúzia de piquetes puderam ameaçar parar o país, barricando-se em meia dúzia de rotundas.
Durante aqueles (e todos os outros) dias, verdadeiramente, estivemos nas mãos de quem acumula impunemente e só conhece facilidades. Sócrates aceita, obedece e apoia, pois claro! E usa a polícia, sim senhor! Mas para escoltar os nossos sequestradores pela A1 fora, como tiveram a pouca-vergonha de nos mostrar pela tv: Jerónimo Martins e Belmiro de Azevedo requisitaram gratuitamente os serviços da ordem, pagos com os nossos impostos, para nos poderem vender o que nós comemos e consumimos e que já quase só eles podem vender. Está mais que visto que é aí que está toda a “crise”.
A semana que aí vem prepara outras confusões. O Governo doméstico insistirá nos seus “resultados” nas contas públicas e nas restrições orçamentais, para continuar a deixar engordar quem acumula (muito) com a “crise” e recusar enfrentar os verdadeiros desafios – agora acossado pelas reivindicações de cada vez mais sectores – e, enquanto reza pelo apaziguador sucesso da “selecção”, se tiver tempo, chegar ao tal “acordo” (que não é acordo nenhum) para a revisão agravada do Código de Trabalho. O Conselho Europeu tentará “emendar” a “incompreensão” demonstrada pelos votos irlandeses e impor a inflexível Europa dos poderosos e assim salvar as “carreiras” de Sócrates, Durão e outros que tais.
Somos hoje (ainda) reféns das estafadas e autoritárias políticas da “inevitabilidade” e do privilégio para @s privilegiad@s, mas… não será que devemos resgatar outras respostas?
Tiago Gillot