Testemunho – Novas tecnologias

Há histórias incríveis, e esta é uma delas. Trabalho numa pequena empresa (PME) que tem um “esquema” de contratos de trabalho interessante, pois o meu contrato inicialmente era com uma entidade que não é a mesma que onde trabalho. Sei que é necessário fazer sacrifícios para arranjar um emprego nestes tempos tão difíceis pelos quais passa o nosso Portugal.

Sem aviso nenhum, depois de ano e meio de trabalho os chefes chegaram ao meu gabinete com um ar de mistério e convocaram-me para uma reunião. Chamaram os empregados um a um, eu fui o último a ser chamado.

Chefe: – Sabe que o “esquema” que tínhamos vai acabar, portanto a partir de agora vocês vão a começar a receber o ordenado pela entidade onde trabalham. Isto não é motivo para receio, é apenas sair de uma empresa e entrar noutra; aliás, vamos-lhe depositar um ordenado como indemnização.

Eu: – OK, lá terá de ser…

Chefe: – Tem assinar o seguinte: uma rescisão de contrato e o novo contrato, a partir do dia 1 de Janeiro de 2010.

Eu: – Mas aqui neste contrato o ordenado é menor!

Chefe: – Como esta é uma empresa que esta a começar não podemos ter muitas despesas, portanto o ordenado é menor mas o subsídio de alimentação é Maior. No entanto, vamos dar-lhe ajudas de custo para continuar a receber o mesmo valor líquido.

Não se assuste com as cláusulas, é um contrato normalíssimo com tudo o que por lei deve de ter.

Continuei a ler o contrato e vi que o ordenado descia em 200€, o horário de trabalho tinha mais duas horas semanais que o anterior, e ainda um mês de experiência.

Assinei o documento, porém sabendo que era uma aposta de alto risco onde os patrões levaram a melhor, pois perdi ano e meio de trabalho numa empresa, renunciei aos meus direitos, entre outras coisas.

Só consegui dizer:

Eu: – Espero que assim como nós estamos a confiar na empresa, a empresa também confie em nós!

Chefe: – Claro! Não há problema nenhum, toda a nossa actuação está baseada na lei.

Um dos meus colegas quis levar o papel da rescisão para casa e não o deixaram. Tudo isto foi feito com muito mistério à mistura e de um modo muito repentino, às 17h30 da tarde. Fiz isto como uma aposta num emprego, uma vez que o trabalho é muito precário neste país, mas receio que tenha sido uma aposta para perder, já que a partir de agora vou descontar menos para a segurança social, com todas as consequências que isso tem se ficar desempregado.

Há coisas das quais eu não falo muito, pois não conheço bem as leis de Portugal, mas à partida parece-me um bocado estranho ter um contrato de trabalho numa entidade diferente daquela onde efectivamente trabalho. Porém, o meu caso não foi tão esquisito como um colega meu que sendo de uma área das novas tecnologias, tinha um contrato como vigilante nocturno. Será que estes patrões, por estarem ligados ao Ensino, nos estavam a pagar com fundos comunitários ou recebiam algum tipo de ajuda do Governo?

Imagino que haja milhares de Portugueses nesta situação precária e de exploração, onde estamos nas mãos daqueles que têm o dinheiro, o poder e os conhecimentos para sugar os fundos da nação para lucro própio, ter grandes carros, grandes casas e nos é que trabalhamos e estamos como estamos, .

É muito provável que estas linhas não cheguem longe nem cheguem a ouvidos de quem devem chegar, pois nós, os precários, não temos os conhecimentos nem o dinheiro que eles têm, mas como podemos fazer se temos que nos alimentar e pagar a renda da nossa casa? Será que esta exploração acabará algum dia? Realmente duvido, já que pelo que tenho visto este pais é de gente muito capaz e competente… Mas também é o pais dos grandes aldrabões do emprego que fazem estas coisas com Zé Povinho por saberem que não há
muitas alternativas.

Não sou Português de nascimento, mas sou muito Português de coração, e só vos posso alertar para se afastarem deste tipo de gente se puderem ter um bocado de dignidade, já que eu não pude porque não tenho meios como fazê-lo. Ando sozinho na vida, tenho que pagar casa e comida e não tenho quem me ajude…

Espero não ter sido chato de mais, e agradeço à minha grande amiga que me permitiu utilizar o seu espaço para desabafar um bocado a frustração de vida que tenho pelo facto de ter vindo de um país estrangeiro com muita vontade de lutar, e agora só me apetece ir embora para outro país onde tratem melhor as pessoas.

Com lágrimas no meu rosto e sem horizonte na minha vida…

Convite para a minha festa!

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