Trabalho Temporário e como criar um off-shore laboral sem representação

CartazVF-e1454424851679No dia 23 de Fevereiro decorreu no ISCTE um seminário sobre Trabalho Temporário, sua representação e negociação e ação coletiva. Promovido pelo centro DINAMIA, este seminário contou com a presença de vários dirigentes sindicais e activistas e a ideia era abrir o debate público sobre a problemática da falta de representatividade no emprego temporário.

O seminário iniciou-se com a apresentação de um relatório sobre a negociação coletiva e a representatividade de trabalhadoras e trabalhadores temporários na Europa (VS/2014/0543). Um relatório sobre emprego temporário, mas também sobre desemprego, que usa os dados do último Labor Force Survey do Eurostat (estudo feito a cada 6 anos). De acordo com este estudo, que analisa as dinâmicas do emprego temporário entre 2008 e 2014 dentro da UE28 e da ZE19 (zona euro), Portugal e Espanha têm taxas de emprego temporário muito superior às médias europeias. Portugal conta com uma média de 21,4%, enquanto Espanha bate todos os recordes com uma taxa de 24%. O mesmo estudo sugere-nos que o desemprego teve uma redução em 0,7 p.p. , justificada por uma taxa de crescimento do Trabalho Temporário (TT) de 30%, numa Europa onde a crise económica e social não têm dado tréguas. De um modo geral, não parecem existir diferenças entre sexos no que toca à contratação com recurso ao TT, mas é nos jovens que a incidência é maior.

À luz da precariedade e das condições sócio-económicas, o estudo em análise confirma que os trabalhadores temporários são os principais prejudicados no que toca ao salário e às condições de trabalho, estimando-se que quem está nesta condição recebe, em média, 60% do salário auferido por quem tenha um trabalho permanente (World Employment Social Outlook 2015). Com salários mais baixos e um futuro incerto, os trabalhadores temporários têm por isso muita dificuldade em organizar as suas vidas, tanto a nível pessoal como profissional, já que estabilidade económica e perspectivas de carreira não combinam com este vínculo precário.

As conclusões deste relatório final vão muito de encontro ao que tem sido defendido pelos Precários. É urgente seguir e aplicar políticas públicas que combatam a propagação deste tipo de contratação, pensada para facilitar a vida a quem contrata e para precarizar a vida de quem é contratado. Há que reforçar a regulação, aumentar os impostos das agências de trabalho temporário e aumentar os impostos sobre os lucros das empresas que utilizam o emprego temporário em larga escala.

Posto isto, são a representação, negociação e ação coletiva compatíveis com esta condição precária? Há espaço para representar trabalhadores e trabalhadoras num cenário laboral onde a rotatividade e a precariedade são entraves óbvios à sindicalização? Há que pensar novas formas de representação? Que papel têm os movimentos sociais nestas mutações laborais?

Referiram-se os exemplos da Linha de Saúde 24 e do Plano de Emergência de Combate à Precariedade e ao Desemprego dos Precários Inflexíveis como formas de envolvimento dos movimentos sociais. Mas será suficiente?

Do lado dos sindicalistas, defende-se a necessidade de melhorar os incentivos à sindicalização, ainda considerada como forma de representação por excelência. Falou-se na necessidade de se estender o conceito de assalariado, para que a negociação não seja exclusiva dos trabalhadores permanentes ou dos trabalhadores por conta de outrem; na necessidade de se investir na comunicação com as trabalhadoras e os trabalhadores temporários e de se promover a articulação entre sindicatos e movimentos não sindicais, como as comissões de trabalhadores e os movimentos sociais.

Numa perspectiva legal e política, defende-se a urgência em limitar uma lei que é em tudo favorável ao uso de vínculos precários, fruto dos interesses privados que motivam as Sociedades de Advogados quando elaboram a legislação laboral.

O trabalho temporário é o novo “trabalho de fim de linha” e se já não vamos a tempo de acabar com ele, não deveriam os sindicatos ultrapassar a visão sindical centrada na representação de trabalhadores permanentes? Boas práticas como o caso português do acordo de empresa entre a Sociedade Pauta das Flores e o SITESE (Sindicato dos trabalhadores e técnicos de serviço) com fim a limitar a contratação a termo e o trabalho temporário parecem dar-nos a entender que sim, é possível. Então, de que estamos à espera?

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