Uma gota num mar de ilegalidades: cerca de 30 mil empresas notificadas pela Segurança Social

A Segurança Social fez saber e a notícia está em toda a imprensa de hoje: um pouco mais de 31 mil empresas serão notificadas durante este mês para pagamento de dívidas. Apenas neste curto universo de empresas devedoras, foram apurados 231 milhões de euros de cotizações que, tendo sido feitas pelos trabalhadores (11% do seu salário), foram ilegalmente retidas pelas empresas – o que constitui crime de abuso de confiança fiscal. Ou seja, os trabalhadores descontaram, mas estas empresas retiveram o valor cativado ao salário dos trabalhadores, não procedendo à devida transferência para a Segurança Social – não só da parte respeitante ao trabalhador (11% do salário), mas também daquela que é da responsabilidade da entidade empregadora (a chamada “Taxa Social Única”, ou seja 23,75% do salário). No total, o valor em dívida por estas empresas agora notificadas é de 662 milhões de euros. 
Infelizmente, esta operação de recuperação de dívidas às empresas representa uma gota de propaganda num mar de tolerância perante as ilegalidades. Os dados (oficiais, divulgados na Conta Geral do Estado de 2010, conforme notícia aqui) são monstruosos: a dívida total à Segurança Social ultrapassa já os 7 mil milhões de euros, sendo que mais de 83% é de “cobrança duvidosa”; a dívida com origem em contribuintes (empresas, na sua larga maioria) era no ano passado de 5,5 mil milhões de euros, dos quais mais de 92% são considerados de “cobrança duvidosa”. Perante este cenário de terror, que configura uma brutal descapitalização da Segurança Social, a inaceitável passividade na cobrança de dívidas às empresas contrasta com a forma implacável, cega e injusta como estão a ser perseguidos os trabalhadores a falsos recibos verdes. Esta notícia divulgada hoje apenas reforça a urgência de resposta à carta enviada pelos movimentos de trabalhadores precários ao senhor Ministro da Solidariedade e Segurança Social, Pedro Mota Soares.
Tendo em conta a gravidade da situação, a tutela e os responsáveis na Administração parecem optar pela propaganda. Só assim se compreende a inflexibilidade e o silêncio de Pedro Mota Soares perante a forma injusta como 50 mil trabalhadores a recibos verdes estão ameaçadas de penhora de bens e contas bancárias, enquanto permite que as empresas acumulem dívidas gigantescas impunemente. E só assim se compreende que Nelson Ferreira, vice-presidente do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, ainda tenha o descaramento de dizer que cobrança a este pequeno universo de empresas anunciada hoje é uma “acção pedagógica” e que “o comportamento dos agentes económicos deriva de algum desconhecimento da lei, mais do que de um aproveitamento doloso dos fundos”: uma verdadeira provocação, tendo em conta a situação actual e o sacrifício que está a ser pedido aos mais fracos, nomeadamente aos trabalhadores a falsos recibos verdes.

Os trabalhadores exigem justiça. Os movimentos de trabalhadores precários não deixarão passar esta tentativa de encobrimento da verdadeira situação na Segurança Social e nas dívidas que ameaçam o seu futuro. Não nos deixamos enganar: esta tímida iniciativa da Segurança Social não é uma resposta ao problema nem deixaremos que sirva de justificação do massacre sobre milhares de trabalhadores a falsos recibos verdes. Manteremos a denúncia e luta pela Segurança Social, pela justiça nas cobranças e nas contribuições.

Notícias, por exemplo, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui ou aqui.

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