Estatuto dos Profissionais da Área da Cultura

Apreciação da Associação de Combate à Precariedade – Precários Inflexíveis à proposta do Governo

A Associação de Combate à Precariedade – Precários Inflexíveis apresenta, no âmbito da consulta pública, a sua apreciação à proposta do Governo para o Estatuto dos Profissionais da Área da Cultura.
Enquanto organização de combate à precariedade, conhecemos a dura realidade dos e das profissionais da cultura. As profissões da cultura são, há décadas, fortemente afectadas pela precariedade, com um grosseiro e persistente incumprimento dos direitos laborais mais básicos, como o acesso ao contrato de trabalho. Acompanhamos, desde o início da nossa actividade, as organizações e movimentos dos trabalhadores e das trabalhadoras da cultura, apoiando frequentemente as suas mobilizações.


Os efeitos particularmente graves da crise sanitária para os trabalhadores e as trabalhadoras da cultura, em que o necessário encerramento das actividades deixou a maioria sem trabalho e sem rendimentos, revelou de forma ainda mais clara as consequências deste contexto de desprotecção laboral. Esta profunda precariedade deixou milhares de profissionais sem protecção, tendo como única alternativa os apoios extraordinários – que, além de insuficientes, excluíram injustamente muitas pessoas.
Num sector dominado pela precariedade extrema, em que o contrato de trabalho é a excepção, a paragem ditada pelas medidas de gestão da crise sanitária teve efeitos devastadores. Embora precipitado pela pandemia e pelo impacto severo nas actividades culturais, o problema é estrutural. Este diagnóstico, difícil de contestar pela sua evidência, partilhado por profissionais e organizações, tem de ser o ponto de partida para alterar esta realidade. Após décadas em que se banalizou um padrão de precariedade e desrespeito pelos direitos laborais, a resposta tem de passar por medidas que reconhecem a natureza do problema e correspondem a uma mudança real.


A evidência desta situação insustentável e, sobretudo, a mobilização dos e das profissionais da cultura, é a origem do processo para a elaboração do Estatuto dos Profissionais da Área da Cultura. Foi este contexto que definiu os objectivos a cumprir pelo Estatuto, conforme foi também anunciado pelo Governo: criar um quadro de cumprimento dos direitos laborais e combater a precariedade; e assegurar uma efectiva protecção social, adaptada à realidade da prestação de trabalho no sector.
Salientamos a importância de ter sido reconhecida a força dessa exigência de mudança, instituindo um processo de diálogo para a elaboração do Estatuto que envolveu as várias associações do sector. Consideramos, acompanhando a perspectiva dos e das profissionais e das suas organizações representativas, que este processo para a aprovação de um Estatuto é uma oportunidade única para virar a página após anos de abuso permanente, permitido pela passividade ou por falsas soluções.

Como nota prévia, registamos, no entanto, que a proposta do Governo em apreço não corresponde aos objectivos traçados e às expectativas de mudança que gerou. Esta posição é unânime entre as organizações do sector, que partilharam o seu desconforto pela forma como esta proposta não expressa o trabalho de diálogo que foi levado a cabo durante cerca de um ano – identificando limitações, recuos face a compromissos assumidos durante o processo e a adopção de medidas que se afastam das soluções necessárias.

A Associação de Combate à Precariedade centra a sua apreciação nas questões consideradas mais relevantes relativamente ao enquadramento laboral e à protecção social.