A 3ª marcha dos mineiros tornou-se na Marcha de Madrid

Depois de duas impressionantes marchas que ocorreram em Madrid após a chegada dos mineiros das Astúrias e Aragão, na 3ª feira de madrugada e a segunda na 4ª feira após o almoço, ontem partiu às 19h30 uma manifestação de 15 mil pessoas de Atocha para as Puertas del Sol. No final da manifestação, e como ocorreu na manifestação da tarde, a polícia carregou sobre os manifestantes deixando vários feridos e detendo várias pessoas. O governo de Mariano Rajoy exibe com estas violentas cargas policiais o maior espelho da realidade: não há austeridade sem autoritarismo.

Os mineiros que foram anteontem recebidos de madrugada por centenas e milhares de madrilenos continuam os seus esforços para falar com o ministro da Indústria, José Manuel Soria, que até ao momento se recusou terminantemente a recebê-los. A intransigência sequer em falar com estas trabalhadoras e trabalhadores que marcharam mais de 400 km até à capital espanhola demonstra o espírito impositivo e autoritário do governo. A reivindicação dos mineiros passa pela recusa do encerramentos dos seus locais de trabalho, minas de carvão que o Estado apoiava até agora e que abasteciam o mercado espanhol. 

Ontem foi o dia em que o primeiro-ministro Mariano Rajoy apresentou no Parlamento um pacote de medidas de austeridade similar ao implementado em Portugal, de igual brutalidade e destruição do Estado Social, como anunciam unanimemente os jornais espanhóis. Durante a tarde a segunda manifestação dos mineiros, que enchia pacificamente a Av. Castellana, foi atacada a meio pela polícia anti-distúrbios, que partiu o protesto em dois, disparando balas de borracha e gás lacrimogénio sobre os manifestantes, procurando dispersá-los. As imagens da violência policial correm por todo o mundo, cifrando-se a carga da tarde em pelo menos 76 feridos e oito detidos.

Muitas pessoas deslocaram-se imediatamente para o Congresso dos Deputados, onde se juntaram a um grande conjunto de funcionários públicos, cercando o edifício e obrigando Rajoy a fugir pela porta dos fundos. Os manifestantes gritavam “Aqui está a gruta do Ali Babá!”. 

Ao final da tarde partiu às 19h30 uma manifestação de 15 mil pessoas de Atocha para as Puertas del Sol, onde ontem de madrugada centenas de milhares se concentraram para receber os mineiros no final da sua Marcha Negra. Além dos mineiros, o movimento 15-M e a “Maré Verde”, protesto contra os cortes na Educação, estavam juntos. Após a chegada à conhecida praça, cantaram-se as músicas tradicionais dos mineiros, assim como as palavras de ordem “Madrid obrero, apoya los mineros”, “Que viva la lucha de la clase obrera” (ver vídeo abaixo). O protesto formal terminou pelas 21h45. 
Às 22h a polícia carregou sobre a praça, para realizar, segundo fontes policiais, um “desalojo contundente”. Foram cargas sucessivas, tendo a polícia disparado balas de borracha sobre a multidão e atacado com bastões pessoas isoladas, o que obrigou os manifestantes e trauseuntes a esconder-se nas lojas e bares. A polícia entrou em vários estabelecimentos agredindo pessoas e detendo outras, havendo registos de carga dentro do El Corte Inglés. Começaram a ser incendiados caixotes do lixo e a ser montadas barricadas nas zonas que dão acesso à praça, Preciados, Callao e Tirso Molina. Foram detidas nove pessoas e há pelo menos seis feridos. Simultaneamente houve confrontos entre manifestantes na zona do Congresso. Há relatos de confrontos em vários locais da cidade. 

Segundo declarações de um mineiro asturiano, Menéndez, que encabeçava o protesto da noite, os mineiros estão bastante preocupados com a actuação da polícia e do governo, advertindo “Creio que há muita raiva e as pessoas estão à espera que alguém dê o primeiro passo para fazer algo mais”. 

A terceira carga policial sobre manifestações em 24h em Madrid, que já ultrapassaram claramente o âmbito apenas do protesto dos mineiros, demonstra um espírito de desrespeito absoluto pela contestação e o direito ao protesto, entre todos os outros direitos das pessoas. O novo regime de austeridade mostra as suas garras e a sua natureza em Espanha. Não admite contestação. Não admite democracia. E esta noite Madrid ardeu.


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