Direita lobisomem

A direita portuguesa tem alguma dificuldade em se identificar a si própria. É mais ou menos como um daqueles personagens de histórias de ficção que não acredita que é um lobisomem, quando na realidade lhe crescem pêlos na palma da mão e fica com dentes afiados prontos a mastigar a carne e lamber o sangue das suas vítimas a seguir à meia-noite.
José Sócrates e a direcção política do PS não são peças que encaixem facilmente no puzzle da esquerda, mas também não é o PSD que vai ser o paladino dos serviços públicos e sociais em Portugal. Pelo contrário, a direita portuguesa, em boa parte representada no PSD, parece mais um daqueles lobisomens (ou lobimulher) que ferra os dentinhos nas ovelhas depois da meia-noite, ou neste caso, depois de assinarem uma prateleira já totalmente cheia de dossiers de acordos com o PS, que vão desde a revisão do Código do Trabalho (2009), PECI, PECII e agora o PECIII, também conhecido como Orçamento de Estado para 2011. Entre abstenções e votos favoráveis, a palavra é avançar.

É possível ouvir muitos apoiantes/eleitores da direita portuguesa dizerem que o Catroga, Cavaco ou Ferreira Leite são velhotes que não representam a proposta da tal boa, moderna e bem penteada direita que Portugal tem (bem escondidinha deve estar). O problema, para estes treinadores de bancada da direita portuguesa, é que são mesmo estes Catroga, Ferreira Leite, Cavaco ou Dias Loureiro que são parte da direcção da direita portuguesa. E mais dramático para os eleitores orfãos da sebastianesca nova direita portuguesa, é que são os outros que dizem e reafirmam, que a democracia é coisa que estorva à resolução de problemas e que por isso “deveria ser suspensa por 6 meses para pôr tudo na ordem”. São os mesmos dirigentes que dizem que “quem paga é quem manda”, numa alusão estrábica e inconcebível a uma suposta relação de sacrificado-beneficiário, em que o sacrificado seria a banca ou capital e os beneficiários seriam as pessoas que trabalham, todo o povo que vive num país de pobreza.
A direita portuguesa é toda uma ideologia que tende para o incómodo perante a insubmissão do trabalho ou da opinião livre. É uma noção de democracia que tem alergia a debater opções políticas, sociais ou económicas com as pessoas e que por isso se refugia nos túmulos do sepulcral silêncio ou do infantil “faz de conta que não é comigo”. É a direita acabrunhada que é cabeça da avestruz que se enfia na areia para não estar presente numa homenagem a um dos maiores nomes da literatura e cultura do país. É a direita que envia forças policiais para esmagar manifestações em pontes ou fábricas. É a ratazana suja que chafurda no dinheiro sujo de offshores e empresas imaginárias e que aperta a mão distinta num Conselho de Estado opaco e que se distancia dos cidadãos de cada vez que reune. É a ideologia do medo de quem tem terror que se diga que as dívidas de milhares de milhões de euros à Segurança Social provêm de empresas que não pagam e retêm as contribuições dos trabalhadores. É a ideologia da cobardia que se esconde do confronto necessário à recuperação de dívidas cada vez mais mal paradas e se verga à traficância de poder entre capital e centros de decisão política.
 
A direita portuguesa, de cima a baixo, é a hipócrisia de quem quer ignorar que quem paga pouco manda porque quem manda não respeita quem paga. A direita em portugal, só merece uma resposta, a Greve Geral, a paragem da produção do país, o cerrar dos dentes e das mãos de todas as esquerdas, de todas as cores, e de todos e todas aquelas que procuram uma sociedade mais justa. Por um país que não tenha lugar para quartos escuros e para pessoas de pedra que procuram não abrir a boca para que o ódio não lhes escorra como sangue em lobisomens.

rUImAIA

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