Opinião: E agora, senhoras e senhores… A LEI DA SELVA
Não foi por falta de aviso. Não foi porque não fosse previsível. Tudo o que se passou desde a campanha eleitoral até hoje apontava nesta direcção. As declarações diárias de ministros, primeiros, presidentes, secretários de estado, comentadores e os patrões de todos estes indicavam um caminho a passos largos com os olhos e as mentes neste objectivo.
Cito palavra por palavra o insuspeito Jornal de Negócios, na notícia Acordos Informais suspendem Lei Laboral até que a crise passe “Mais vale receber quinhentos euros do que não receber nenhum. O argumento – básico e eficaz – está a justificar cortes salariais no sector privado. (…) Em Lisboa, dezenas de jornalistas do “i” perderam a isenção de horário e parte do que recebiam por exclusividade. Em Vila Franca de Xira, os motoristas da Rodo Cargo prescindem desde Janeiro de 57 euros por mês que recebiam. Em Trás-os-Montes, a Santa Casa da Misericórdia de Ribeira de Pena só pagou metade do subsídio de férias.”
Bem-vindos à Lei do Mais Forte. Esta lei está escrita em todos nós. É talvez a lei fundamental do planeta. Defende que num grupo os mais fortes dominarão os mais fracos a seu bel-prazer. Os fracos terão senhores a quem devem obediência por virtude da sua força. É a Lei da Selva. Analisando a notícia do Jornal de Negócios (e muitas outras, infelizmente), os mais fortes são as empresas e os mais fracos são os trabalhadores. Ora, eu gostaria de partir do princípio que nós, seres humanos, somos relativamente racionais. Portanto, para nos livrarmos da crueldade e inumanidade que é a Lei da Selva, decidimos criar, nós mesmos, outras leis. Estas leis são acordos, por vezes tácitos, por vezes escritos, que permitem que as sociedades coexistam de modo relativamente pacífico e que não sejamos todos uns animais, com o objectivo principal de vida de nos safarmos enquanto indivíduos, passando por cima de todos os outros, destruindo as vidas de quem quer que seja, para podermos afirmar a nossa superioridade. O percurso que conhecemos da história deslocava-se (a soluços, infelizmente), na direcção da construção de leis de humanidade para que pudéssemos estabelecer uma sociedade boa, procurando caminhar para a nossa própria humanização, a plenitude enquanto seres humanos, libertar-nos da Lei da Selva. O fim das leis humanas significa o regresso da Lei da Selva. A lei por omissão é a Lei do Mais Forte. O caminho para lá chegar tem vários nomes – o que está neste momento mais na berra é liberalização. Mas o Jornal de Negócios afirma-o inequivocamente “Acordos Informais suspendem a Lei Laboral”. O jornal i explica-nos como o dinheiro que os trabalhadores descontaram uma vida para a Segurança Social vai ser utilizado para pagar outras contas do Estado, sem sequer ter que passar pelo Parlamento. O Correio da Manhã diz que os falsos recibos verdes verão a sua vida penhorada pelas dívidas à Segurança Social, que são da responsabilidade dos seus patrões. Os mais fortes estarão a dizer-nos que voltou a Selva e que não nos resta alternativa que não subjugarmo-nos a eles. Esta não é uma questão de incompetência ou objectivo dos governos – este governo, como os seus antecessores, é extremamente competente e tem um objectivo muito bem definido. Um dos seus patrões do momento, Ricardo Salgado, já comentou, com exactidão, que este governo “está a actuar de forma excelente”. O seu objectivo é implementar a Lei da Selva, não só nas relações laborais, como também em todas as leis da sociedade. Eles querem (re)criar antigas leis do homem que mais não faziam que justificar a superioridade das camadas superiores da sociedade sob a massa humana que faz o mundo andar. Exigem-nos que verguemos, que os sirvamos – porque são os mais fortes.
Mas serão eles os mais fortes? Foram criadas “ciências exactas” para justificar a superioridade dos mais fortes. Chamam-lhe Economia mas, tendo em vista o seu objectivo, o seu verdadeiro nome neste momento é Tirania. Chamam-lhe Democracia mas, tendo em visto o seu objectivo neste momento, não o é. E nós? Nós fomos criados e formatados para pensar que somos os mais fracos. Isto é dito diariamente, constantemente, pelos instrumentos de informação que eles controlam. Mas não somos. Teremos muitas amarras que quebrar para nos apercebermos disso. As primeiras amarras a quebrar estão dentro das nossas cabeças. A nossa força é terrivelmente superior à deles. E eles têm plena consciência disso. Quando nós tivermos consciência disso, o dia será nosso. E o futuro será nosso.
João Camargo
http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=499765http://aeiou.expresso.pt/ricardo-salgado-governo-esta-a-atuar-de-forma-excelente=f665589
http://www.ionline.pt/conteudo/141263-governo-ganha-arma-subir-despesa-sem-passar-pelo-parlamento
http://www.jornaisdodia.com/CorreioDaManha.pt.aspx