As lágrimas de crocodilo do FMI

Dentro de todas as contradições vividas na imposição de um novo regime social, o elemento que dá mais golpes teatrais é o Fundo Monetário Internacional. Hoje, o FMI alertou para a necessidade de tornar os cortes mais “graduais”, progressivos, sem apresentação “brusca” de medidas. Lagarde alerta mesmo para evitar a introdução agressiva das medidas mais gravosas, mesmo quando os países intervencionados estejam “sob pressão dos investidores ou tenham perdido o acesso aos mercados”.

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Não se pense no entanto que o FMI tenha mudado a sua opinião ou deixado cair a bandeira da austeridade custe o que custar. Estas declarações a que o FMI nos vem habituando têm provavelmente origem na sua longa experiência de engenharia social, desenvolvida ao longo de 40 anos e vários continentes com os famigerados programas de ajustamento estrutural que esmagaram africanos, asiáticos e sul-americanos durante décadas. A necessidade de implementar o novo regime social da austeridade gradualmente pode ser estrategicamente mais viável (como a rã, representando as populações neste caso, que se coloca dentro de uma panela de água fria, cuja temperatura vai aumentando gradualmente, e que assim é cozinhada sem a resistência que existiria se fosse atirada directamente para uma panela de água a ferver). O jogo do empurrão de culpas entre FMI e governos nacionais (que funciona nos dois sentidos), transfere-se também para o seio da troika, onde se empurram as culpas entre FMI e BCE/Comissão Europeia. A questão é clara, no entanto: se há culpas é porque há culpados e o FMI apenas o deixa mais claro. É uma espécie de jogo do dividir para reinar invertido, em que se dividem as culpas para poder continuar a aplicar a destruição em massa.

Os economistas do FMI concluem num relatório divulgado recentemente sobre a forma como foi gerida a crise financeira e da dívida soberana na Europa: “Em muitos países, os desequilíbrios orçamentais são de tal tamanho que lidar com eles no curto prazo pode ter um impacto dramático na economia”. Esquecem-se, claro, de reconhecer a origem desses desequilíbrios orçamentais, nomeadamente no resgate da banca e do sector financeiro.

As declarações de hoje são apenas mais um golpe de teatro do FMI. Não nos esqueçamos que em Janeiro deste ano o Fundo anunciou no seu relatório anual que havia erros sérios na aplicação de programas de austeridade e que os efeitos eram muito mais severos do que era previsto. O que é que isso mudou na actuação do FMI a nível da imposição de mais austeridade? Nada.

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