Contra a precariedade… estamos aí…

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Terminou com acordo tripartido a Concertação Social. Os patrões, governo e UGT chegaram a acordo naquilo que são as alterações a introduzir ao Código do Trabalho para, alegadamente, modernizar a legislação laboral, flexibilizar as relações entre empresas e trabalhadores, modernizar e adaptar a economia à famosíssima globalização e liberalização económica.

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No fim da última reunião da Concertação Social, José Sócrates, visivelmente tenso, não teve mais do que palavras de circunstância e já repetidas inúmeras vezes. Aquilo que se percebeu mais uma vez é que as “virtudes” das alterações a um Código do Trabalho já completamente “liberalizado” e desequilibrado vão apenas agudizar objectivamente os problemas sociais. Seja o desemprego, o sub-emprego, a quebra de natalidade ou a opção desesperada de cada vez mais portugueses pela partida para fora do país. Se fosse de outra forma, e se Sócrates e os parceiros que assinaram o acordo estivessem realmente convictos dos passos positivos que o país tinha dado para todos, a economia e as pessoas, só poderiam deixar passar um sorriso ou a imagem de esperança e de positividade. Não foi assim, eles sabem perfeitamente o que assinaram. Saudamos apenas João Proença, da UGT, que coerentemente sorriu e enalteceu as várias qualidades do acordo sustentando a sua posição pela liberalização.

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Segundo o nosso entendimento, a suposta negociação da Concertação foi realmente uma farsa porque o Governo e os patrões já tinham a sua posição consonante, o que atirava a UGT e a CGTP para meros espectadores. Ou então, para a possibilidade de aparecem na fotografia a apertar a mão.

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A “negociação” existente

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Embora agradasse aos patrões a liberdade legal do despedimento por inadaptação, todos sabemos – e o ministro Vieira da Silva até o disse na SIC – que o despedimento em Portugal é fácil. Portanto, esse era um dos pontos onde o “acordo” ou a “negociação” poderia ter lugar, e teve. Todas as medidas mais graves para os precários ficaram lá, a legalizar a precariedade (como disse ontem Francisco van Zeller, da CIP) com os famosos 5% de indulgência. Ou a arrasar com os contratos colectivos de trabalho. E a individualizar ainda mais a relação patrão-trabalhador, sendo sempre o trabalhador a parte claramente mais fraca.

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O Governo mais uma vez apertou a mão e curvou-se perante a doutrina de pessoas que dizem coisas como “…ou há precários ou não há nada”. Seguiu-se – corajosamente dirão alguns – a via da reforma. A reforma que fará com que um trabalhador possa isoladamente, e obviamente em franca diminuição, ver-se obrigado a trabalhar 36 horas em 3 dias, não tendo direito a horas extraordinárias.
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Já vimos também que, não existindo qualquer capacidade real do Estado em fazer cumprir a lei no que diz respeito aos “recibos verdes”, contratos a prazo reproduzidos vezes sem conta ou outras vigarices cúmplices, a diminuição legal para 3 anos dos contratos a prazo é positiva. Mas apenas na lei, no papel, porque será mesmo só no papel. O mesmo se passa com a nova licença de maternidade e paternidade, que será só para os mais ricos.

Podemos esclarecer Sócrates e Vieira da Silva: 25% de um salário de 600€ são 150€. Quem vive dignamente com isso? É bem claro quem são os pais e mães destinatários dessa medida… Ficámos basicamente com as sugestões do Livro Branco, que o Governo e patrões pensaram.

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O Governo de Sócrates e Vieira da Silva não procurou com este acordo modernizar o que quer que fosse

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Vieira da Silva, de uma antiga ala esquerdista do PS, gagueja sempre que alguma pergunta difícil lhe é feita e não tem qualquer argumento de defesa. Não faz ideia de quanto ou quando conseguirá reduzir a utilização dos recibos verdes ou contratos a prazo. Diz que “o Estado fará a sua parte”. Mas é o mesmo Estado que continua a ser o maior beneficiário e explorador dos trabalhadores a recibo verde e com contratos a prazo, estando curiosamente neste preciso momento a “modernizar” a sua relação laboral com os trabalhadores das Câmaras e Juntas de Freguesia, criando quadros de direito individual de trabalho, movimentando na prática lugares e posições do quadro público do Estado para o direito individual de trabalho. E abrindo portas ao fornecimento de mão-de-obra através de empresas de trabalho temporário para o Estado, também na sua componente local. Está tudo dito sobre a “parte” que o Estado fará.

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O primeiro-ministro José Sócrates, porque ideologicamente mais convicto que Vieira da Silva, não gagueja e não teme explicar as virtudes do Código do Trabalho e das alterações induzidas.
No entanto, porque está consciente dos resultados práticos das alterações que introduziu na lei, o primeiro-ministro não sorriu, não se mostrou confiante, e apenas conseguiu apresentar as palavras de circunstância do costume no fim da reunião, ficando ainda com tempo para dar uma pancadinha no ombro de Vieira da Silva que dificilmente tirava os olhos do chão. Fraca motivação para quem acabou de dar passos importantes para o país, para a vida das pessoas e da economia.
Ou será que é tudo mentira?José Sócrates sabe bem que o impacto destas leis nas relações entre trabalhadores e patrões é explosivo. E sabe que a precariedade está aí para ficar e para ser legalizada, tal como foi dito. O problema de Sócrates é que os precários são cada vez mais. E cada vez mais é difícil tapar o problema social que a falta de ideias e de coragem continua a criar.

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Coragem seria dizer quantas empresas foram condenadas ou julgadas pela utilização abusiva dos recibos verdes e dos contratos a prazo. E com isso, estabelecer uma relação de quantidade e qualidade quer permitisse projectar a dimensão necessária para a Autoridade das Condições de Trabalho.

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Justo seria integrar de imediato todos os trabalhadores a recibo verde e a prazo que trabalham há vários anos para o Estado. Coragem seria assumir que bandeiras do Governo como as “Novas Oportunidades” e o “Enriquecimento Curricular” são quase suportadas pelos bolsos dos formadores e professores que trabalham a recibo verde e a prazo, contando a vida e os tostões de cada vez que chegam a casa.Sócrates está comprometido. A convicção já se foi, e neste momento, é um poço de fragilidade ideológica. Entre o eleitoralismo a que está destinado e a ideologia de bolso em que nem ele já
acredita, Sócrates baixa a cabeça aos patrões como van Zeller que dizem coisas como “sem precários não há nada”.

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É verdade, sem precários não há nada. E porque não esperamos que seja Sócrates ou Vieira da Silva a defender os nossos interesses, trabalho e vidas, temos de dar os passos que precisamos. É preciso organizar e agir com massa crítica.
Nos empregos, nas escolas, na vida, temos de criar e desenvolver processos de acção, troca de informação, posições de conjunto, debate e confronto.
É necessário começar a desafiar a sério a ordem que nos remete à precariedade e a colocar em causa o equilíbrio das vidinhas de formiga em carreiro em que somos colocados para produzir riqueza e bens, açambarcados pelos sujeitos que concertam a sociedade com o poderes políticos do costume.Somos nós que trabalhamos e produzimos a riqueza que fica nos bolsos deles. Por isso, estamos a começar a acreditar nisso mesmo… Sem precários, não há nada.

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Precários Inflexíveis

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