O Estado da Investigação em Portugal :: opinião de Sara Magalhães
Este é o segundo depoimento no dossier O Estado da Investigação em Portugal (o primeiro, do Prof Manuel Jacinto Sarmento, pode ser lido aqui). Desta vez, pedimos a opinião a Sara Magalhães, investigadora no CBA/FCUL.
“Vou fazer 40 anos este ano. Por isso, ainda passei os meus anos universitários numa época em que podíamos parar para decidir o que queríamos realmente fazer com a nossa vida profissional, e não vivermos asfixiados com a impossibilidade de nos empregarmos. Escolhi fazer investigação científica porque achei, e ainda acho, que a geração do conhecimento permite-nos viver num mundo melhor.
Já nessa altura todos sabíamos que iríamos passar uma grande parte da nossa vida a viver de bolsas. Bolsas, para quem não sabe, são uma espécie de ‘mesada’ que o estado dá. Não é um contrato de trabalho, e portanto não implica descontos para a reforma, nem segurança social, nem 13º ou 14º mês, nem indemnizações. No entanto também todos pensávamos que essa seria uma situação transitória, e que mais tarde ou mais cedo nos encaixaríamos nos quadros da nossa área profissional. Tenho agora quase 40 anos e vejo que, à minha volta, 90% dos meus amigos e conhecidos da minha área vivem ainda de bolsas.
Pessoas que não estão ligadas à ciência podem pensar que essas pessoas que vivem de bolsas aos 40 anos não são grandes profissionais, e por isso têm aquilo que merecem: uma mesada. Isso é mentira em absoluto. Apesar de não existirem horários, a maior parte dos bolseiros que eu conheço trabalham muito mais horas do que as regulamentares, com mais eficiência do que na maioria das outras profissões. Isto tem a ver com duas coisas: uma paixão pela geração do conhecimento e a noção de que esta é uma área extremamente competitiva e que, se não estivermos entre os melhores, nem uma bolsa temos.
Poderia ainda pensar-se que esta competição é salutar, obriga as pessoas a trabalhar. Esta é outra grande mentira. Na Europa, os países que estão na dianteira da ciência são a França e a Inglaterra. Nesses dois países, raros são os investigadores que, aos 40, não têm um emprego fixo. Para além disso, nesses países, como na maioria dos países europeus, não há investigador doutorado a quem não se tenha de fazer um contrato de trabalho. Essa dignificação da actividade de investigação vem reforçar a motivação natural das pessoas que trabalham nesta área, e leva a um ambiente de trabalho mais salutar que facilita a geração de conhecimento.
Respondendo diretamente às perguntas:
P: Como vê o actual panorama da investigação científica em Portugal?
Não conheço obviamente todas as áreas. Daquilo que conheço penso que estamos neste momento numa situação simultaneamente privilegiada e periclitante. Privilegiada porque houve um grande investimento em Ciência nos últimos 20 anos, em particular na formação de novos investigadores. Na minha área, temos vários investigadores de topo, muitos dos quais estão neste momento em Portugal (sendo que a maioria passou vários anos no estrangeiro). Temos ainda uma grande qualidade de formação, e investigadores recém-formados de alta qualidade. Periclitante porque, se não houver um esforço para sedimentar esta comunidade em Portugal, arriscamo-nos a uma fuga de cérebros em massa nos próximos anos, o que levará também a que os jovens procurem laboratórios no estrangeiro, dado que não haverão oportunidades cá dentro. Podemos assim retroceder duas décadas e perder o investimento dos últimos 20 anos em apenas 4 ou 5.
P: Como vê o actual panorama da carreira académica?
Penso que neste momento, a carreira académica, tal como eu interpreto a palavra ‘carreira’, não existe. Carreira a meu ver implica uma situação estável a longo prazo, que permite ter uma visão mais holística sobre a nossa actividade. Actualmente as oportunidades de ‘carreira’ são extremamente reduzidas. O que existe neste momento são soluções a vulso. Quem quer ter uma ‘carreira’ na minha área deve ir para França ou para o Brasil, e muitos já foram.
P: Como vê lógica por trás do investimento em Ciência (nos vários domínios do conhecimento)?
Penso que o governo tem consciência da excelente qualidade dos investigadores destas últimas gerações, e tenta apresentar soluções para manter esses investigadores em Portugal. No entanto, essas soluções são insuficientes por várias razões. Primeiro, porque não há uma tentativa real de incorporar esses investigadores nos quadros(o máximo que se consegue neste momento são contratos a 5 anos). Segundo, porque o governo aposta na ‘excelência’, oferecendo contratos aos ‘melhores’, mas esquece-se que, se não houver toda uma estrutura montada para que essa excelência se possa manifestar, de nada serve esse investimento.
P: O que acha que deveria ser diferente?
Muita coisa. É urgente renovar os quadros universitários. É urgente que as bolsas de pós-doc, sendo uma solução precária, vão aumentando de valor progressivamente com os anos de experiência profissional. É urgente que as bolsas de doutoramento incluam fundos para as ‘bench fees’, tal como acontece com os estudantes que fazem teses no estrangeiro financiadas pela FCT, é urgente que haja abertura de concursos para projetos todos os anos a uma data fixa, à semelhança do que acontece em todos os países Europeus. E muitas outras coisas. Finalmente, é urgente que o governo não tenha vergonha de investir na Ciência, e que invista também em programas que demonstrem aos Portugueses como isso é tão importante.
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Artificial common sense has started creating images, composition texts, and composing music. What pleasure cook next? Determination robots succeed humans?
Is this look-alike
created aside false intelligence? Refreshing, isn’t it?