Regime da troika é o paraíso das multinacionais

Em reportagem no Jornal Dinheiro Vivo, a jornalista Ana Rita Guerra explica as fragilidades de grandes multinacionais – Apple, Amazon, Starbucks, Ikea, Zara, Microsoft, HP, Google e Starbucks, entre outras. Identifica o trabalho escravo, a fuga aos impostos e o controlo sobre os trabalhadores como principais fragilidades. Estas não são no entanto as fragilidades das grandes empresas – são a sua matriz de obtenção de lucro, à conta da exploração máxima, precarização total de quem trabalha e fuga aos impostos.

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Escravatura: É conhecido de longa data o caso da Foxconn, na China, onde a Apple produz os seus gadgets, obrigando os trabalhadores a assinarem um contrato em que prometem não se suicidar, apesar das condições de trabalho selvagens, de 13 dias de trabalho consecutivos sem interrupção, de 98 horas de trabalho extraordinário por mês, de salários que não chegam para a alimentação, etc… Conhece-se o caso dos outsourcings para fábricas de escravos no Brasil, Argentina ou Bolívia, feitas pela Zara, propriedade de Amancio Ortega, 3º homem mais rico do Mundo segundo a Forbes. A Amazon mantinha os seus empregados num armazém nos EUA com temperaturas acima de 43ºC, e era frequente desmaiarem. Quando se queixavam, eram despedidos. Jeff Bezos, o patrão da Amazon, foi nomeado a pessoa do ano da Time em 1999. É o 15º homem mais rico do mundo, segundo a Bloomberg. Recentemente foi nomeado o 2º melhor gestor do mundo, a seguir… ao da Apple.

Impostos? A fuga aos impostos também faz parte da fórmula do sucesso das multinacionais – das novas a Google, a Amazon, o Facebook e o Starbucks têm-se notorizado pelas fugas massivas, geralmente apoiadas pelos governos da austeridade. No Reino Unido, a Starbucks passou cinco anos sem pagar impostos. Nos Estados Unidos, a Apple foi acusada de não pagar 74 mil milhões de euros de impostos, utilizando como sede fiscal a Irlanda, que se tornou nestes dias num paraíso fiscal (já estava próximo disso antes, não tendo tal evitado, e pelo contrário seguramente contribuído que caísse nas mãos da troika antes da Grécia e Portugal). As grandes empresas têm um histórico coerente de fuga aos impostos, em particular em países fragilizados. A Suez, multinacional de água privada, não pagou impostos durante 5 anos na Bélgica, enquanto a Nestlé pressionava o governo suíço a baixar os seus impostos para manter a “competitividade” da Suíça.

Espionagem. Na Alemanha, já é conhecida há muito tempo a técnica de espiar os trabalhadores, como foi denunciado por quem trabalhava na Aldi e no LIDL, que contratava detectives para investigar os funcionários e funcionárias enquanto trabalhavam nas pausas para café, pondo escutas nos telefones e até filmando as próprias casas de banho. Recentemente a IKEA  foi apanhada a espiar quem trabalhava, em particular os dirigentes sindicais e até os clientes. Recentemente até a BBC foi apanhada a espiar os contactos electrónicos do seu pessoal.

O regime da troika deixa cair todas as protecções que permitem evitar estas situações, e até as promove. As leis do trabalho em Portugal já são mais flexíveis que na China, sob as reformas laborais do velho governo Passos-Portas. Os governos locais são os infiltrados que abrem as portas para o assalto, contando no fim com uma parte do espólio. O saque de Portugal, como do resto dos países sob o regime de austeridade da troika, é um convite às multinacionais a que venham extrair dos países tudo o que possam: os recursos naturais, as infraestruturas públicas, a força de trabalho das pessoas e a sua dignidade, recebendo para tal benefícios fiscais (foi você que pediu uma redução do IRC?) ou mesmo isenções totais. É isso que significa “atrair investimento estrangeiro”, “livre circulação de capitais”, “competitividade”, “flexibilidade e mobilidade”, é isso a simplificação e “viver de acordo com as nossas possibilidades” – dar-lhes tudo o que produzimos, e aceitá-lo de bico calado. O regime da troika é o regime das multinacionais. Quanto mais sucesso têm estes “casos de sucesso”, pior estão os países onde eles operam. Os seus interesses são contrários aos nossos. É uma questão de classe.

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