Opinião: "Lá pelas duas e quinze, o segurança há-de chamar pelo seu número"

Nove horas da manhã. Acaba de abrir a porta do Centro de Emprego da Amadora para fazer escoar a fila de trezentos ou quatrocentos metros. Passo a passo, chego à senhora das senhas: “é para me inscrever”, “onde mora?”, “em queluz”. Senha rosa 85.


Nos cinquenta ou sessenta metros quadrados cabem uns pequenos biombos com as ofertas de emprego e cabem também largas dezenas de pessoas sentadas e outras tantas em pé. Estão muitas mulheres de várias origens, muitos homens imigrantes, muita variação etária.

O contador das senhas está avariado. “Senha verde 62!”, “senha rosa 28!”.
Nove horas e quinze minutos. “Já não há senhas. Terá que vir amanhã de manhã. às 9h”, ouve a única mulher de véu.
Outra voz, atrás de mim, relata que “no outro dia, vim para aqui às 5 e vinte da manhã”.
As pessoas sabem que é uma merda estar aqui. Vê-se, nas caras delas. Há muitas que trazem o envelope, com a informação de despedimento. Tantas delas, nem terão direito a nenhum apoio, como dizia a senhora atrás de mim. “E para que serve fazer os cursos de formação, se depois não há emprego?”.

“Senha verde 81!”, “senha rosa 81!”.
Enquanto se espera, joga-se o jogo das cadeiras. Cadeira que vaga tem nova ocupação.

“Senha rosa 85!”. É a minha vez!!
“É para me inscrever”, “vem requerer o subsídio?”, “sim”, “preciso de um documento identificativo”. (Pausa) “Lá pelas duas e quinze, o segurança há-de chamar pelo seu número”.

Apanhei o comboio e só pensava no Pedro Mota Soares (novo ministro da segurança social) e no Álvaro Santos Pereira (novo ministro do emprego, entre outras coisas). Será que eles já entraram num sítio destes? E será que eles já decidiram qual dos dois fica com o desemprego? (Ou farão eles à moda da outra senhora e apagarão a palavra do dicionário?)

E vim almoçar. A casa dos pais.

A. Feijão

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