O primeiro-ministro iniciou ontem a sua ofensiva política para preparar a alteração das leis laborais, que se prevê para o início do próximo ano. Passos Coelho diz que não tem medo de greves e já deixou claro qual será a sua argumentação para justificar o verdadeiro desmantelamento das regras mínimas no mundo do trabalho que o seu Governo irá impor: o discurso, com ar grave e sério, terá sempre a tónica na chantagem do desemprego e na constatação da precariedade. Por isso não hesita em recorrer à demagogia e afirma que “o maior mito que se tem vivido na sociedade portuguesa é que não se pode mexer na legislação laboral para não afectar os direitos”.
“A quem serve este regime, que supostamente é extremamente avançado de direitos sociais? Que regime avançado é este que só gera desemprego, precariedade, recibos verdes ou contratos a termo?”. É desta forma brutal que Passos Coelho nos explica que pretende impor um novo regime baseado na austeridade, na ausência de direitos e no autoritarismo. Estão lançadas as bases para uma guerra aberta contra os trabalhadores, em que o primeiro-ministro acha que pode utilizar os precários como figurantes e armas de arremesso. Da nossa parte, repondemos já que vamos à luta.
Mais uma vez, o discurso aposta na constatação da precariedade, como se fosse um produto inevitável dos tempos que correm. Infelizmente, não se trata de incompetência, mas de uma escolha cínica para concretizar objectivos muito concretos: as vidas precárias, resultado da cumplicidade de sucessivos Governos com a ilegalidade e a sobre-exploração, são utilizadas como argumento para culpar os direitos; este raciocínio retorcido diz-nos que é preciso acabar com os direitos porque há pessoas que não têm acesso a eles; o que verdadeiramente se pretende atingir é o desmantelamento do contrato social e das bases de toda a legislação laboral – ou seja, eliminar o reconhecimento da desigualdade nas relações laborais para assim favorecer o mais forte, numa altura em que a impunidade, o desespero do desemprego e a generalização da precariedade já concedem um poder tão extraordinário aos patrões.
Pretensamente corajoso, o discurso do primeiro-ministro esconde quase tudo o que verdadeiramente pensa Passos Coelho. Para o primeiro-ministro, os precários não são uma preocupação, mas uma oportunidade para argumentar em favor do que pretende. O que o Governo vai propor, essa tal “batalha em nome do emprego para os mais jovens”, são coisas concretas, mas que Passos Coelho prefere deixar para depois: terminar com os contratos de trabalho e impor um regime de contrato único; desmantelar o horário de trabalho, aumentando-o e flexibilizando-o; liberalizar os despedimentos e torná-los mais baratos para os empregadores; prolongar já os contratos a prazo, impedindo assim que milhares de trabalhadores sejam integrados nas empresas em que trabalham; diminuir os apoios em situação de desemprego, para manter uma pressão forte para diminuir salários e baixar a referência dos direitos.
Passos Coelho tenta desesperadamente dizer que só podemos escolher entre a precariedade ilegal ou a precariedade já legalizada e limpinha. Nós afirmamos outra alternativa, que procura soluções a sério para os problemas que se colocam. Por isso, entregaremos em breve a Lei Contra a Precariedade no parlamento, uma proposta que combate verdadeiramente a precariedade e que conta com a força de dezenas de milhares de pessoas. Contamos com todos para esta recta final: nas recolhas de assinaturas na rua, divulgando esta Ininciativa Legislativa de Cidadãos e os seus objectivos, juntando subscrições e contribuindo para engrossar esta alternativa.