Qual a face mais negra da austeridade?
Desde o passado dia 4 de Agosto que mais de 7000 estrangeiros foram detidos pela polícia grega para questionamento, baseando-se a sua detenção apenas na interpretação dos polícias sobre a sua proveniência. Mais de 2000 foram presos e deverão ser deportados para os seus países de origem. A austeridade mostra mais uma das suas faces tenebrosas: os imigrantes, sem qualquer processo, são destinados à deportação para países em guerra, transportados em vagões amontoados, recebidos pela polícia de choque e internados em campos. Mais de 4 mil polícias participaram na operação. Este filme não é novo.
Estação de comboio em Atenas recebe um comboio cheio de estrangeiros detidos
As pessoas estrangeiras por estes dias podem ser paradas pela polícia na rua sem qualquer motivo que não seja a sua aparência física e ser internadas sem causa. Apesar das expulsões em massa serem proibidas, de ser obrigatório um processo de averiguações e um motivo para identificar as pessoas, a mais recente operação da polícia, operação Zeus Xénio (deus da hospitalidade) levou à detenção de 7000 pessoas e à intenção expressa publicamente pelo ministro da Ordem Público, Nikos Dendias de expulsar 2000 que continuam presos. A lei internacional também proíbe a extradição de pessoas para o seu país de origem caso sejam vítimas de perseguição ou corram risco de tortura. O governo grego fechou o seu gabinete de asilo político, rejeitando todos os pedidos. Muitos dos imigrantes detidos são afegãos, paquistaneses e sírios.
A Human Rights Watch denunciou ainda as condições de detenção, tratamento e alojamento dos migrantes detidos: que foram recorrentemente agredidos, mantidos sem contacto com o exterior ou conhecimento das acusações que lhes são imputadas, más condições de saúde e salubridade nos edifícios onde são mantidos e transportados. Há relatos de que a FRONTEX, força de segurança da União Europeia para a questão da imigração tem promovido condições desumanas e degradantes nas detenções que efectua, tendo inclusivamente morto pessoas.
O clima político de medo e de opressão criado pela austeridade permanente é utilizado pelo regime austeritário na Grécia e o ministro Nikos Dendias chega ao absurdo de defender mesmo que o problema da Grécia com a imigração é maior que o seu problema financeiro. A retórica anti-imigrante é e continuará a ser uma excelente distracção para os verdadeiros problemas dos países, razão pela qual também se viu nas últimas eleições uma grande ascensão na Grécia de um partido nazi, a Aurora Dourada, que ataca imigrantes nas ruas, criando milícias e atacando bairros inteiros. A polícia não actua perante estes crimes, contrastando com a sua atitude perante as manifestações constantes contra a austeridade. No parlamento grego o partido nazi pressiona o governo a adoptar medidas contra os imigrantes, e Samaras responde afirmativamente. A extrema-direita revela-se um aliado natural da coligação e do regime austeritário. A face mais negra da austeridade é uma face suja e racista, que utiliza uma situação de desespero colectivo para desviar a atenção das causas da crise e atacar exactamente as suas vítimas.
Imigrantes agredidos por gangues da Aurora Dourada dão conferência de imprensa em Atenas (Karadjias AP)
O impotente governo grego, com pouquíssima legitimidade e em colapso permanente, tenta segurar-se a esta bóia de ódio, declarando que é “a entrada de imigrantes que trouxe o país à beira do colapso”. Até ao final do ano o governo quer construir centros de detenção com capacidade para até 10 mil pessoas “Quem quer que seja detido permanecerá preso e será deportado” declarou Dendias à Associated Press. Há um contraste gritante entre as declarações do governo e a realidade estatística, que indica que só em 2012 oito mil imigrantes terão abandonado voluntariamente o país devido ao desemprego e à situação económica.
O maior partido da oposição, Syriza, atacou o governo, considerando a operação um “pogrom” e um “insulto para a justiça e a humanidade”. Acusou o governo de estar a tentar esconder um novo acordo com a troika, de mais 11,5 mil milhões de euros em cortes e mais medidas austeridade.
Este racismo de estado comprova a relação inequívoca entre a austeridade e o autoritarismo. É preciso o autoritarismo, em todas as suas expressões, para se conseguir manter este regime de injustiça intrínseca e permanente, de saque aberto aos rendimentos e bens públicos. A única maneira de garantir uma transição para o regime da austeridade é a força. A força contra os mais fracos. E não apenas a força da mensagem mediática e propagandística, mas sobretudo a força do ataque para dividir. A velha táctica de dividir para conquistar. Um ataque que pretende colocar nacionais e estrangeiros uns contra os outros, para criar um inimigo fantasma que faça esquecer quem nos retira direitos, serviços, salários e dignidade.
O racismo é como a austeridade, e a austeridade é obviamente racista: não se baseiam em nada que não seja a subjugação, atacam e dividem os mais fracos para garantir os privilégios dos mais fortes, para elas a razão e a lógica não têm significado, degradam-nos a todos e precisam de ser rejeitadas. Este não é um filme novo. Não podemos assistir impavidamente até ao fim porque já sabemos como acaba.
Parabéns pela denúncia desta fase obscurantista da democracia grega. Queria só fazer uma pequena correcção de carácter ortográfico: quando dizem que a “Aurora Dourada, que ataca emigrantes nas ruas, criando milícias e atacando bairros inteiros.” – onde está 'emigrantes' não se deveria ler imigrantes?
A resplandecente aurora dourada diz tudo, trazendo a sua luz civilizadora, ou será bárbara?A fase mais negra da austeridade é aquela que mescla tudo em RGB ou CMYK.Entendemos todos a nossa condição de servos ou de super-servos e optamos por continuar na mesma ou por nos libertamos dessa condição. Mas neste momento está toda a gente de olho na bandeirola imigrante, foram-se os “F” e ficou a política do I. Imigrante, Ignorância, Inércia, Imutável, Imaterial. E PT continua a sua histórica tradição de se afundar em austeridade e espalhar os seus miserá por latitudes e longitudes cruzadas e multiplicadas.