Apoios: decisão do Tribunal Constitucional demonstra que resposta do Governo é insuficiente
O Tribunal Constitucional, em decisão anunciada esta quarta-feira, declarou a inconstitucionalidade do alargamento dos apoios sociais introduzido pelas alterações aprovadas pelo Parlamento em Março passado. No entanto, as reacções à decisão e o próprio conteúdo do acórdão demonstram bem que o problema central não é a batalha jurídica, mas sim garantir uma resposta forte a quem precisa de protecção. Depois de ter optado por uma crise inteiramente artificial, que incluiu o pedido de apreciação constitucional, o Governo permanece isolado, apesar desta decisão aparentemente favorável, tendo sido forçado a garantir de imediato que nada muda e se mantêm as alterações que reforçaram os apoios. É o Governo no seu labirinto, preso à sua opção de definir apoios muito limitados para todo o ano de 2021.
Recordamos que está em causa o alargamento dos apoios extraordinários, que, com a alteração aprovada pelo Parlamento, passaram a ter como base de cálculo os rendimentos de 2019 – ou seja, antes da pandemia – e não os rendimentos dos 12 meses anteriores (em que já se sentem totalmente os efeitos da crise sanitária, com forte quebra para a grande maioria das pessoas). Estes apoios extraordinários, recorde-se, foram retomados logo a partir de Janeiro, quando o Governo foi forçado a reconhecer que o apoio que tinha definido para 2021, o AERT, era muito insuficiente e incapaz de responder à necessidade de protecção de milhares de pessoas.
Foi a omissão do Governo que levou a que o Parlamento aprovasse este reforço dos apoios. Aliás, durante o período de apreciação no Parlamento que levou à aprovação do reforço dos apoios, o próprio Governo introduziu outras alterações nas regras dos apoios extraordinários e poderia ter garantido logo nessa altura esse reforço. E, por outro lado, após as alterações aprovadas pelo parlamento, o Governo aprovou logo de seguida um diploma em que reconhece a importância dessas alterações e até introduz aquilo a que chama uma “salvaguarda” para enquadrar esse reforço.
A reacção do Governo à decisão revela bem como o verdadeiro problema não é jurídico, mas sim a falta de uma resposta consistente para apoiar quem ficou sem rendimentos em plena pandemia. O Secretário de Estado Tiago Antunes garantiu ontem que “algumas das alterações entretanto introduzidas por estes diplomas [do Parlamento] já foram posteriormente salvaguardas em legislação do Governo e portanto mantêm-se em vigor”. Ou seja, o próprio Governo apressou-se a garantir que nada muda no reforço do valor do apoio para quem ainda o está a receber, nem no acesso ao mesmo, ou seja, que está tudo bem porque se mantêm as regras com as alterações que considerou inconstitucionais. Parece estranho, mas esta aparente contradição não é mais do que o Governo cercado pela opção errada de ter definido apoios insuficientes e de adiar até ao limite a necessidade de os reforçar.
A realidade demonstrou que o reforço dos apoios era e continua a ser necessário. Neste momento crítico, em que se vivem as consequências de uma quarta vaga da pandemia, a prioridade tem de ser prolongar o apoio para quem precisa.
Devido às regras definidas pelo Governo, os apoios retomados no início do ano estão a terminar para milhares de pessoas: se nada for feito, neste segundo semestre do ano, ficará sem protecção uma parte significativa dos trabalhadores independentes (neste momento, e apenas até Agosto, o apoio à redução de actividade só abrange quem trabalha nos sectores do turismo, cultura, espectáculos e eventos). Por seu lado, quem terminou as prestações de desemprego (subsídio de desemprego ou subsídio social de desemprego) vê também acabar este mês a respectiva prorrogação de 6 meses. Como é evidente e o Governo já não consegue esconder, o AERT não serve e deixará milhares de pessoas sem apoio ou com um apoio muito insuficiente.
Como esta decisão e o embaraço de um Governo isolado demonstram, o que importa mesmo é assegurar protecção efectiva a quem está a sofrer as consequências da crise e não tem alternativa de rendimentos. É por isso que o Governo foi e será julgado. E é isso que conta para as vidas de milhares de pessoas que não podem ficar para trás.
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